segunda-feira, 8 de novembro de 2010

Problemas de Metaética

Há muito tempo atrás, antes mesmo de eu fazer estágio, publiquei um texto sobre Metaética. Este conceito foi originalmente imaginado pelo mestre Marcelo, mas nós dois desenvolvemos idéias diferentes sobre o significado do termo: para ele, a Metaética seria a pergunta que fundamenta toda o campo filosófico da Ética - "por que ser bom?", enquanto que, para mim, ela seria "a prática de moldar a própria ética futura, escolhendo as experiências que vivemos e como as vivenciamos, tomando por base nossa ética atual." Ao reler o texto que escrevi a respeito deste interessante e pouco explorado assunto, percebo que ele continua atual. Contudo, depois de uma noite de insônia bastante produtiva deste final de semana, que trouxe a Metaética de volta à minha memória, percebi que a definição do conceito se beneficiaria de uma ampliação. Então, segundo minha nova maneira de ver, a Metaética é possui dois componentes - um aspecto filosófico e outro psicológico. A diferenciação entre os dois é meramente didática, para que nós, pensadores ocidentais, possamos compreender mais plenamente o que está por trás desta idéia.

O aspecto filosófico da Metaética é justamente aquela apontada por Marcelo - por que devemos realmente sermos bons? O que nos "obriga" a assim proceder? Considero esta questão como sendo a parte mais filosófica da questão por que está intimamente ligada à outras do campo da Filosofia Moral: o que é o Bem? Pode o ser humano ser bom? Como diferenciá-lo do Mal? De fato, poderia se dizer que todas elas são parte da mesma grande pergunta, sendo a diferença entre elas o sabor pessoal que a questão de "por que ser bom?" traz, e que a diferencia de todas as outras questões, que pretendem ser universais. Por ela ter esta característica, ela permite maior liberdade de movimentos. Segundo um filósofo moral ortodoxo, baseado nas antigas perguntas, todos os seres humanos necessariamente buscam o Bem, enquanto que, na nossa nova formulação, não podemos afirmar o mesmo. Teríamos que dizer que todos os seres humanos idealmente preferem o Bem, mas que a intensidade com que o procuram varia conforme as circunstâncias. Por exemplo, um homem pode acreditar num determinado conjunto de crenças morais e considerá-las como corretas, mas não aderir verdadeiramente a elas seja por acomodação, seja por desilusão.

Para os fins deste ensaio, não importa muito o conteúdo desta desmotivação, e sim o processo por trás dela. Se para o filósofo moral a Ética é algo eterno e universal, para o psicólogo interessado no assunto, ela é sempre dependente do contexto, e portanto, mutável. Conforme vamos nos desenvolvendo, também se desenvolvem e se alteram nossas crenças e comportamentos éticos. Há muitos estudos em Desenvolvimento Moral que descrevem estas mudanças, tendo especial destaque aqueles conduzidos por Lawrence Kohlberg. Este pensador chegou à conclusão de que nossa Ética passa, grosso modo, por seis níveis de desenvolvimento, do hedonismo mais simplório até o altruísmo mais desapegado. Estes níveis seriam estruturas universais, isto é, teoricamente estão presentes em todos os povos do planeta, ficando a diferença de que falei anteriormente dependendo do conteúdo ideacional que preenche estas estruturas, e do caminho que cada indivíduo leva para desenvolvê-las, que não é tão linear quanto a teoria pode fazer parecer. Não vou falar muito a respeito deste interessante teoria, por que, se assim o fizesse, acabaria me desviando do meu assunto principal, e me veria obrigado a estudar muito mais, por que não sei quase nada a respeito dela.

O que quero indicar com Kohlberg é que é consenso entre os teóricos que a Ética muda conforme o tempo passa, a pessoa interage com o ambiente e se modifica. Hoje isto parece óbvio, mas até nem tanto tempo atrás, isto não era lá muito claro. Uma pessoa que ajudou a clarificar isto foi o psicólogo do desenvolvimento Jean Piaget. Originalmente, seu projeto teórico era o de construir uma Teoria do Conhecimento Humano, isto é, como as pessoas percebem o mundo ao seu redor, como processam estes dados e como os utilizam. Para construir tal teoria, ele investigou o desenvolvimento intelectual de crianças, desde os primeiros meses de vida até os 13 ou 14 anos de idade. De novo, não vou falar muito da teoria de Piaget por aqui, pelos mesmos motivos de antes. Todavia, um de seus conceitos me parece central aqui - o de Esquema Cognitivo. Em suas pesquisas, Piaget descobriu que as crianças utilizavam "algorítmos mentais" para processar as informações vindas do exterior, que mudavam conforme a idade. Um dos mais famosos exemplos disto é o da conservação da matéria. Se pedirmos para uma criança de 3 ou 4 anos se 300ml de água em um copo comprido é a mesma quantidade que 300ml de água em um copo mais largo, ela dirá que o copo comprido possui mais água, mesmo se mostrarmos para ela que as quantidades eram iguais antes de as colocarmos nos respectivos copos. Porém, se fizermos esta mesma pergunta para a mesma criança aos 7 ou 8 anos, ela ela olhará incrédula para nós, e responderá com muita convicção "é claro que é a mesma coisa, sua besta!", demonstrando que as mudanças cognitivas acontecem, muitas vezes sem que percebamos.

Penso que algo parecido acontece no desenvolvimento moral. Partindo das duas teorias citadas, acredito que a nossa Ética, e a maneira como a percebemos, também passa por fases diferentes de crescimento. Num primeiro momento, nós não possuímos nenhuma crença ética, por que não necessitamos. Porém, conforme crescemos, e nos vemos obrigados a conviver com outras pessoas, vamos as desenvolvendo, primeiro nos inspirando em nossos cuidadores, e depois de maneira mais autônoma. Entretanto, isto ocorre quase que totalmente fora da nossa consciência. E é aqui que penso estar minha contribuição original ao campo da Ética: da mesma maneira que desenvolvemos estratégias para monitorar nossos processos cognitivos, a Metacognição, desenvolvemos estratégias morais para monitorar o nosso crescimento ético, a Metaética. Poderia dizer que a Metaética é um processo metacognitivo mais refinado, e que define, utilizando os fundamentos éticos que possuímos aqui e agora, a ética que queremos ter no futuro, escolhendo de maneira consciente o que queremos ser no futuro. Como eu disse no começo desse texto, não há como fazer isso de maneira perfeita, por que, como mudam nossos preceitos éticos, mudam também os nosso preceitos metaéticos, fazendo da perfeição um ideal sempre distante. Dentro deste modelo teórico, Ética e Personalidade seriam dois conceitos pouco diferenciados, ou pelo menos muito dependentes um do outro.

Além dessas considerações teóricas, tenho algumas outras observações para fazer. A primeira delas é que, do mesmo modo que os níveis mais avançados da escala de Kohlberg são atingidos por poucos indivíduos, a Metaética é uma habilidade pouco difundida. Talvez, como a Metacognição, ela exista em forma potencial em todos, mas só alguns a atualizem e a transformem em algo digno de nota. Outra hipótese que tenho é que a Metaética, pelo menos da maneira como a defini aqui, só apareça em pessoas nos níveis morais mais elevados, posto que é nessas etapas de desenvolvimento que o indivíduo consegue se desapegar de suas crenças éticas, e vê-las como ferramentas, meios para um fim, que se modificam conforme as necessidades. Ou não. Em todo caso, continuarei elaborando novas idéias a respeito dessa teoria.

quarta-feira, 3 de novembro de 2010

Utopias - Interlúdio

Decidi escrever este post para organizar esta série, e para que as três milhares de pessoas que lêem este blog compreendam o que se passa pela minha cabeça enquanto planejo os posts do futuro.

No presente momento, estou escrevendo o texto sobre "Utopias Piratas". Entretanto, já tenho em mãos três outros livros de utopia, e a intenção de adquirir um mais dois ou três. Os três livros que já tenho são "A República" do Platão, "Nova Atlântida" de Francis Bacon e "Looking Backward" de Edward Bellamy. Os dois primeiros são bastante famosos, tendo sido escritos por dois gigantes da Filosofia, e portanto dispensam introduções. "Looking Backward", por outro lado, apesar de ter sido bastante famoso e influente em sua época, especialmente nos Estados Unidos, parece ser relativamente desconhecido hoje em dia, pelo menos no Brasil. Pretendo remediar, pelo menos parcialmente, esta situação, descrevendo aqui a utopia desenhada por Bellamy.

Os três livros restantes, que ainda tenho que encontrar em algum lugar, são "Utopia" de Thomas More, "Walden" de Henry David Thoreau e "Walden III" de Rubén Ardila. O primeiro quero ler por que, francamente, se não foi o livro que iniciou a tradição literária das utopias, foi o que a codificou, isto é, organizou e deu um rosto para uma série de outros livros que apareceram depois. "Walden III" trata da experiência de Análise do Comportamento levada à cabo no Panamá em 1979, enquanto "Walden" é o relato da experiência individual de Thoreau no meio do mato. Possivelmente não deveria considerar este último como um verdadeiro livro de utopia, mas o valor sentimental de ler e resenhar Walden I, II e III é grande demais para ser jogado fora.

Por fim, pretendo comentar um último livro, que, apesar de não estar à minha imediata disposição, está aqui ao lado, na biblioteca da FABICO: "Zona Autônoma Temporária" de Hakim Bey, pseudônimo do autor de "Utopias Piratas". De novo, não é um livro sobre utopias imaginárias, mas sim sobre como criar micro-utopias localizadas, e como elas surgiram em vários lugares ao longo do tempo, com as mesmas características. Acho que vale a leitura.

Lembrando sempre que eu mudo de idéia fácil, e posso resenhar outros livros antes desses, mas pelo menos agora vocês têm noção do que pode vir por aí.

domingo, 31 de outubro de 2010

O Rootz e o Épico

É fato conhecido que, com a convivência, amigos íntimos acabam às vezes desenvolvendo formas próprias e peculiares de comunicação: olhares, gestos, palavras que, embora não digam nada para as outras pessoas, são carregadas de significados para aqueles que as usam. Entre eu e meus amigos, existe uma filosofia de vida, uma ética, que pretendo explicar aqui, apresentando e discutindo o significado de duas palavras que, embora sejam de uso corrente em Porto Alegre, ganharam um peso diferente para nós: Rootz e Épico.

Originalmente, a palavra "roots" significava "raiz" em inglês. Ela foi introduzida no português (pelo menos aqui em Porto Alegre, cabe lembrar) por fãs de Reggae, para descreverem músicas e coisas verdadeiramente "regueiras", de raiz, o mesmo que "true" representa para os fãs de Heavy Metal. Com o tempo, contudo, "roots" virou "rootz" (diferença meramente estética, por que a pronúncia é a mesma), e passou a significar muito mais do que apenas aquilo que é relacionado com o reggae. Agora, quando alguém diz que algo é rootz, ela quer dizer que aquilo merece respeito e admiração, por ser algo fora do normal. Por exemplo, quando alguém conta que caminhou do Centro até a Restinga para não pagar passagem de ônibus, outra pessoa, espantada, pode dizer apenas "rootz". Para eu e meus amigos, porém, esta palavra ganhou uma dimensão nova: quando queremos dizer que algo é rootz, queremos dizer que, além de respeitável, algo é digno de ser feito, quando não necessário. Usando o mesmo exemplo de antes, certamente consideraríamos o fato de alguém ter ido à pé até a Restinga como rootz não só por que é um longo caminho, como também por que a pessoa se exercitou até o seu limite, e ainda poupou R$2,45 em passagem. Mais do que isso, é rootz por que envolve superação de si mesmo.

Contudo, nada impede que algo rootz seja completamente inútil, quando não prejudicial. Eu posso emitir um série de comportamentos extremamente cansativos, que me colocam em situações complicadas ou de risco, e que mesmo assim não beneficiam ninguém, ou apenas a mim mesmo de maneira superficial. Esta categoria de rootz merece respeito, por ser algo difícil de se fazer. Ainda assim, receamos dar-lhe este título, pois sentimos que lhe falta algo. Eis então que entra o conceito de "épico". Normalmente, quando uma pessoa normal, fora do nosso círculo de amizades, fala que algo é épico, quer dizer que algo é muito grande ("meu pênis tem proporções épicas"), ou é relativo a um gênero literário ("os livros de J.R.R. Tolkien marcaram a literatura épica"). Na nossa concepção de "épico", estas definições não são excluídas ou deixadas de lado, mas são como que derretidos e incorporados a uma outra definição, mais abrangente. Pessoalmente, utilizei esta palavra muito poucas vezes de maneira concreta. Contudo, é ela que norteia toda a nossa ética de ação direta no mundo.

Quando me disseram que a reitoria da Universidade Federal de Ciências da Saúde de Porto Alegre tinha sido ocupada, a primeira coisa que exclamei foi "Épico!" Por que esta ocupação foi épica? Não poderia ter considerado ela apenas rootz? Bem, certamente a ocupação foi rootz, por que ela envolveu acampar e dormir dentro de uma instituição de ensino superior que normalmente não se presta à dormitório, bater de frente com a reitoria e ter que mobilizar um corpo estudantil antes acostumado à apatia e à complacência. Isso É rootz, mas também muito mais. Ser épico, pelo menos da maneira como eu encaro as coisas, é agir de maneira rootz, isto é, enfrentar desafios cada vez maiores e mais complexos, sacrificar a própria vontade egoísta e correr riscos em nome de uma causa comum, pelo coletivo. Necessariamente, ser e fazer algo épico envolve a transformação do mundo a nossa volta, tornando-o mais belo, mais justo e mais verdadeiro. No fim das contas, ser épico é escrever uma nova história, tão grandiosa quanto "O Senhor dos Anéis" ou "Os Varões Assinalados", se não ainda maior, por que acontece aqui e agora, diante de nossos olhos, transformando um valor potencial em um valor vivo e real. Carregamos hoje a tocha que nos foi passada por aqueles que no passado foram considerados heróis, revolucionários e guerreiros, e continuamos sua obra da melhor maneira que podemos. Em suma, ser épico é ser rootz em nome do Bem Maior.

Cada vez mais, eu e meus amigos temos transcendido a esfera individualista da rooteria, e evoluído para seus níveis épicos e coletivos, não apenas em palavras ou sonhos, mas em atos concretos, como tudo que é realmente épico deve ser. Construímos uma oca no outrora desocupado e inútil pátio do Instituto de Psicologia, fomos para o meio do mato coletar material de construção, ocupamos reitorias, semeamos sementes e muitas outras coisas dignas de respeito. Porém, o que realmente importa é que estamos construindo um mundo melhor, e que, não importa o que acontecerá com nossos feitos depois que partirmos, nós lutamos como homens e mulheres dignos e dignas de respeito e admiração. Isto é ser épico. Isto é a vida que vale a pena ser vivida.

Utopias (6)

Aventuro-me agora em novos territórios. Ao invés de resenhar um livro sobre uma utopia ficcional, falarei sobre um livro que conta a história de um homem que dedicou sua vida a construir uma: Giuseppe Garibaldi. O livro a que me refiro são suas Memórias, organizadas por Alexandre Dumas, com base em relatos e diários escritos pelo guerrilheiro do século XIX. Por que escrevo sobre Garibaldi nesta série? Bem, preciso admitir que tenho um fraco por heróis de guerra. Talvez isto se deva ao fato de eu ter nascido e crescido em uma sociedade sem guerras, ter aprendido a respeito delas através de meios distantes como livros ou a TV e nunca ter presenciado uma morte. Acho justo que eu seja considerado ingênuo neste assunto por todos estes motivos. Ainda assim, não consigo deixar de admirar pessoas como Garibaldi, que passou quase a vida inteira lutando em nome de um ideal - a liberdade das nações. Por um ideal tão abstrato e distante, ele passou por inúmeras dificuldades e privações: fome, cansaço, perseguição inimiga, marchas forçadas e risco de morte. Terá tudo isso valido à pena todo esse sacrifício?

Penso não só na vida de Garibaldi, mas também nas vidas dos que lutam hoje para construir um mundo melhor. Não lutamos mais guerras, não pegamos mais em armas, mas continuamos a enfrentar muitos desafios, e a fazer muitos sacrifícios, que, apesar de não serem mais os mesmos que Garibaldi encarou, ainda são capazes de nos fazer questionar se não seria melhor abandonar toda esta confusão, nos preocuparmos apenas com a nossa sobrevivência e o nosso bem-estar, e deixar as utopias para os livros e para os idiotas. Lendo suas Memórias, fico imaginando se, em nenhum momento, Garibaldi fraquejou, e pensou em mandar tudo às favas: "dane-se a Itália! Danem-se as repúblicas! Eu vou montar uma rede de supermercados e lavar minhas costas com dinheiro!"

Não sei se ele chegou a pensar algo parecido com isto. Por ele ser humano e, portanto, frágil e imperfeito, imagino que em algum momento ele deva ter cogitado a possibilidade de levar uma vida pacata, levemente egoísta e reacionária. Porém, mesmo que ele tenha pensado, não levou estes planos adiante. Bem pelo contrário por que, até onde sabemos, ele continuou lutando pelo ideal das nações e pela liberdade de uma Itália unida e democrática até o final de sua vida. Pouco do que ele aspirava se concretizou, e não da maneira como ele desejava. Seria isso sinal de que seria melhor ele ter cuidado da própria vida? E nós, que nos metemos a mudar o mundo, não deveríamos aprender com este fracasso e parar de buscar algo inalcançável?

Na noite que passei na Reitoria da UFCSPA, tive uma conversa bastante produtiva com o Marcelo. Foi uma daquelas conversas que, embora se esqueça quase tudo o que foi dito, nunca se esquece o impacto que causou em nossos corações. Lembro, porém, de pelo menos uma coisa que discutimos. De fato, poucas revoluções foram bem sucedidas, e muito poucas mantiveram-se fiéis aos seus ideais. Contudo, nenhuma delas foi em vão, por que trouxe ao mundo uma nova maneira de ver e viver que mudou todo para sempre. A mudança efetiva pode ter sido pequena em extensão, mas inegável em sua existência. O Rei voltou a reinar na França depois da Revolução de 1789; Stalin tornou-se um ditador ainda mais cruel que os tsares; A República Rio-Grandense perdeu a guerra contra o Império e voltou a ser uma província, depois de 10 anos de lutas sangrentas. Agora, por causa disso, o Antigo Regime voltou a vigorar, a idéia do Comunismo perdeu o valor e o sonho de uma sociedade justa e democrática morreu? Não. As coisas mudaram, e para sempre. Talvez não da maneira como gostaríamos, mas mudaram. E é por isso que lutar sempre vale à pena.

Garibaldi não lutou em vão, e nem nós lutamos hoje. Construímos a sociedade do futuro e, mesmo que aos trancos e barrancos, evoluímos. Talvez seja por isso que admire Garibaldi: de certa forma, continuo hoje o trabalho que ele começou tanto tempo atrás, e que na verdade, era também a continuação de um trabalho ainda mais antigo que o dele. Vejo-me como parte de uma antiga e nobre linhagem de guerreiros, poetas e amantes que, malgrado seus insucessos, nunca perde a esperança de construir o Reino de Deus na Terra. Não viverei para ver tal proeza, mas resta-me o consolo de saber que, se isto um dia vier a acontecer, eu não fiquei de braços cruzados, e ajudei, da melhor maneira que pude, a tornar isto realidade.

Ainda na onda de falar sobre utopias que aconteceram de verdade, no próximo texto comentarei o livro "Utopias Piratas", escrito pelo cientista político e anarquista Peter Lamborn Wilson, mais conhecido por seu pseudônimo Hakim Bey. Vou ler o livro este final de semana, ou, no mais tardar, antes que alguém o reserve na biblioteca (por que eu não conheço ninguém que não leria algo sobre utopias e piratas). Depois desse livro, pretendo resenhar "Zona Autônoma Temporária", do mesmo autor, onde ele fala sobre algo parecido. Esse, porém, eu ainda preciso bater em alguém da biblioteca pra reservar e ler, então pode demorar um pouco.

Utopias (5)

Como alguns dos meus leitores devem se lembrar, tempos atrás, comecei a escrever uma série de posts sobre utopias, isto é, sociedades humanas que funcionam de maneira perfeita e auto-sustentável. Como tais sociedades não existem de fato, pelo menos não ainda, tive que buscar meus exemplos em livros. A primeira utopia que comentei, em dois posts separados, foi "Walden II", imaginada pelo psicólogo B.F. Skinner e fundamentada pelos princípios das ciências do comportamento. O livro seguinte que eu comentei aqui foi "Horizonte Perdido", de James Hilton. Por fim, o último livro "utópico" que comentei não tratava de fato de uma utopia, mas de uma idéia que considerei muito próxima - "Sebastopol", de Tolstoi, e a idéia da paz atingida através da guerra. No final deste texto, disse que demoraria para ler outro livro sobre utopias, mas que não abandonaria a idéia de escrever mais a respeito do assunto por aqui.

Preciso dizer que menti. Na época em que este último post foi publicado, tinha recém começado a ler "A Ilha", de Aldous Huxley, e achei a história tão envolvente que terminei de lê-la em tempo recorde. Entretanto, não consegui escrever com o mesmo entusiasmo. Comecei dois rascunhos diferentes, mas em nenhum dos dois consegui passar do terceiro parágrafo. Consegui, isso sim, escrever uma monografia com o título de "O Trabalho nas Utopias e na Realidade", comparando as condições de trabalho em "A Ilha", "Walden II" e o mundo real, tentando encontrar pontos em comum. A proposta dessa monografia era bem distinta do que pretendo fazer aqui para o blog, mas utilizarei algumas partes dela para fundamentar meu texto (e me ajudar a lembrar da história de "A Ilha", já que faz um bom tempo desde que a li).

Tendo lido já alguma coisa sobre utopias, me sinto tranquilo o bastante para dizer que toda a literatura utópica busca responder às seguintes questões:

1) Quais foram as contingências geográficas e históricas que permitiram tal sociedade se desenvolver de maneira contínua e segura?
2) Qual modelo econômico foi por ela adotado, de que maneira os recursos naturais e humanos são utilizados e como ele garante o bem-estar da população?
3) Como são tratadas as questões comportamentais, individuais e coletivas, da população e suas principais instituições (vida em família, vida amorosa, amizades, vida em comunidade, trabalho, lazer, educação, saúde, religião)?
4) Qual o sistema político de tal sociedade, e como sua "administração central" (se esta existir) gerencia as questões anteriores, bem como as relações com outras sociedades e estados?

Estas perguntas, em última análise, são componentes de uma outra pergunta que o autor deve responder se deseja realmente descrever uma utopia: por que esta sociedade é perfeita, e por que deveríamos invejá-la? Cada livro da literatura utópica é, de certa forma, a vitrine das idéias de seu criador, que mostra aos demais como o mundo seria perfeito se todos resolvessem adotar os seus princípios e aplicá-los à realidade (ou, de maneira inversa, por que o mundo é a bagunça que é, e o que estamos fazendo de errado). Em outros termos: o autor é um vendedor, sua ideologia é seu produto e a utopia que ele descreve é sua vitrine. Alguns escritores são mais felizes do que outros nessa empreitada. Por exemplo, em "Horizonte Perdido", James Hilton parece estar mais interessado em contar uma história e estimular a imaginação dos seus leitores do que em convencê-los de que aquilo que acontece em Shangri-Lá fica em Shangri-Lá deveria acontecer no resto do planeta. Por outro lado, em "Walden II", Skinner só não escreveu um epílogo dizendo "acreditem em mim, gente, condicionamento operante é a coisa mais maravilhosa que existe" por que seria redundante, já que o livro inteiro é quase um infomercial de Walden II (é possível ler nas entrelinhas um "mas espere! Ainda tem mais!" entre um capítulo e outro). Tolstoi, que em "Sebastopol" não descreve uma utopia, também é bastante claro a respeito do que ele acredita ser certo ou errado.

Aldous Huxley em "A Ilha" é mais sutil que Skinner, e muito mais claro do que Hilton a respeito da mensagem que quer passar, por que, ao mesmo tempo que descreve os componentes de sua sociedade ideal, não descuida dos aspectos estéticos da história que conta. Ela começa com Will Farnaby, o personagem principal, naufragando no Oceano Índico, e indo parar na ilha de Pala, que era onde ele originalmente desejava chegar. Farnaby é jornalista, e um agente pago por uma grande empresa petrolífera para infiltrar-se em Pala, desestabilizar o governo local por dentro, e submetê-lo ao comando do ditador da ilha vizinha, Rendang. No princípio, apesar da hospitalidade da população local, que o recebe e cuida de seus ferimentos como se fosse filho de Pala, ele colabora com as forças que desejam destruir a harmonia da ilha para aumentar sua riqueza material e poder. Entretanto, conforme vai conhecendo o lugar, seu funcionamento, e vive experiências purificadoras, Farnaby abandona seu cinismo e, ainda que seja tarde demais para salvar Pala, ele consegue ver claramente a beleza daquela sociedade. Não vou dar mais detalhes da história, tanto por que não quero estragar a leitura de quem se interesse, quanto por que eu sinceramente não lembro de muitos detalhes. O que eu vou falar, e que ainda me lembro, é da maneira como Huxley tentou responder às quatro perguntas que formulei anteriormente.

A ilha de Pala, apesar de naturalmente cheia de recursos, é isolada do resto do mundo por sua geografia, contando com apenas um porto natural, sendo todo o resto da costa impossível de atracar, ou pelo menos muito perigoso de navegar. Era como qualquer outra monarquia pobre da Ásia, com um povo supersticioso e fisicamente pouco saudável até a chegada de um médico britânico. Este médico, cujo nome me escapa agora, fora contratado para tratar o Rajá de um câncer na mandíbula. Tal operação não era sua especialidade, mas a realizou assim mesmo, com a ajuda de técnicas de sugestão e hipnose. O Rajá, agora a salvo de doenças terminais, ficou impressionado com as capacidades cognitivas do médico, e pediu para que ele ficasse em Pala e o ajudasse a fazer o que se pode chamar de uma completa reforma cultural na ilha. Aqui, fica óbvio para o leitor de "A Ilha" o que Huxley imaginara como a sociedade perfeita: uma fusão harmoniosa entre o melhor da ciência ocidental e o melhor da ética e espiritualidade oriental.

Esta revolução cultural, diferente da realizada em "Walden II", levou pelo menos três gerações, e envolveu mudanças graduais, porém profundas, nas práticas dos habitantes de Pala. Primeiro, o médico britânico conquistou o apoio da população feminina introduzido técnicas de higiene que em muito diminuiram as mortes durante o parto, bem como a qualidade de vida em geral. Depois disso, já contando com a confiança pública, ele pode ser dar ao luxo de atacar hábitos supersticiosos daninhos e substituí-los por outros hábitos, mais racionais. Junto com o Velho Rajá, que também era um grande intelectual e reformador, ele instituiu políticas públicas de longa duração, e que depois de 100 anos, quando Will Farnaby naufrga em sua costa, ainda se encontravam em efeito.

Como já disse antes, faz tempo que li o livro, e a grande maioria das propostas de Huxley me escapam à memória agora. Entretanto, todas elas seguiam o mesmo princípio: como seria uma sociedade onde todas as suas partes servissem o bem maior, e estimulassem o desenvolvimento saudável e consciente de seus membros? Ao contrário do que acontece em "Admirável Mundo Novo", onde as pessoas trabalham para manter o sistema de consumo irrefreável funcionando às custas de sua própria individualidade, em "A Ilha", tudo trabalha para favorecer o crescimento espiritual das pessoas, e torná-las cada vez mais conscientes de si, de seu contorno, de seus deveres e de sua missão. Por exemplo, os papagaios da ilha foram treinados para falarem, de tempos em tempos, palavras como "atenção!" e "aqui e agora!" para que os palaneses fossem constantemente lembrados de que devem estar atentos, e viverem aqui e agora, e não se perderem em divagações inúteis sobre o passado ou o futuro. A família em Pala, apesar de ser constituída de forma tradicional, com pai, mãe e filhos, também é atravessada pelo CAM, Clube de Adoção Mútua. No CAM, as crianças adotam outros pais e outras mães, fora de sua família nuclear, tantas quanto quiser ou precisar. Deste modo, quando esta se cansasse de seu pai ou de sua mãe biológicas, ia para a casa de outro, onde seria acolhido como um filho. Deste modo, nenhuma criança seria obrigada a conviver o tempo todo com a neurose de seus cuidadores (ou, na melhor das hipóteses, poderia alternar entre neuroses diferentes conforme lhe convir).

A ciência em Pala também é vista de maneira diferenciada. O Velho Rajá e o médico, apesar de serem ambos entusiastas de inovações, eram também cautelosos em relação ao que deixavam entrar em Pala. Por isso, a industrialização era limitada: foram criadas plantas hidroelétricas para gerar energia para geladeiras e assim estocar a produção de alimentos por mais tempo, e plantas industriais e poços de mineração existiam em pontos específicos da ilha, mas de maneira limitada. Além disso, nenhum trabalhador era obrigado a trabalhar mais do que o necessário, para que ainda dispusesse de tempo livre para realizar suas atividades de lazer preferidas. Em nossa sociedade produtivista, que clama sempre por mais e mais coisas para comprar e logo jogar fora, isso parece absurdo, mas em Pala, o trabalho tem como principal propósito estimular o desenvolvimento pessoal, e não usar todas as energias do trabalhador para realizar uma tarefa que muito pouco o beneficia, como frequentemente ocorre em tantos empregos.

Também a vida amorosa e sexual dos palaneses é bem distinta, tanto da nossa, quanto dos habitantes de Rendang, quanto mais dos cidadãos do "Admirável Mundo Novo". Ao invés de serem forçados a engolirem diversos tabus referentes à sexualidade, os palaneses são, desde muito cedo, educados a respeito da sexualidade e, a partir de uma certa idade, estas aulas se tornam práticas, quando aprendem a arte do Maithuana, a Yoga do Amor. Aqui, o sexo não é encarado como uma prática de dominação, uma conquista de um homem sobre uma mulher ou vice e versa. É, na verdade, uma expressão de amor entre duas pessoas (qualquer que seja o gênero delas, diga-se de passagem). Existe um apego entre os amantes, mas um apego bem diferente daquele que experienciamos na sociedade ocidental, que não amarra um ao outro irremediavelmente.

Mais notável ainda é o destaque dado para a espiritualidade propriamente dita, e os ritos a ela ligados. No final de sua vida, Huxley estava muito interessado com os possíveis usos de substâncias psicodélicas, que, se bem empregadas, poderiam servir para acelerar o progresso espiritual da humanidade. Tanto Pala quanto a sociedade distópica de "Admirável Mundo Novo" possuem drogas que alteram a percepção consciente da realidade e que estão ao alcance de toda a população. O uso dado a elas, porém, é completamente diferente. Se em "Admirável Mundo Novo" o soma é usado para fugir das dores do mundo e viver em um estado artificial e patológico de felicidade, em "A Ilha" o chá feito com a planta Moksha ("libertação" em sânscrito) é empregada para o exato oposto: expansão da consciência. Também não é utilizada de maneira indiscriminada, como quem toma aspirina, e sim apenas em momentos solenes. A primeira vez é no rito de passagem da adolescência para o mundo adulto, onde os jovens passam por um teste. Tanto meninos quanto meninas precisam realizar uma escalada perigosa, do topo de um penhasco até o Templo Central da ilha, onde eles tomarão Moksha e serão instruídos sobre os deuses, o universo e seu papel nele. Depois deste episódio marcante, o Moksha é tomado apenas em situações especiais, com o intuito de levar aquele que o bebe mais próximo da Iluminação.

Talvez o que mais tenha me chamado a atenção na sociedade palanesa é a verossimilhança com que Huxley a pinta. Ao contrário de Walden II e Shangri-Lá, que parecem ter surgido do éter e funcionando de maneira impecável por passes de mágica (mesmo que seja a "Mágica Comportamental" do Dr. Skinner), Pala impõe-se ao leitor como um lugar que realmente poderia existir. Mesmo sendo uma comunidade muito avançada, especialmente em termos psicológicos, ela é composta por pessoas de verdade, e não "exemplos didáticos" como Walden II. Esta foi a parte que mais me encantou em "A Ilha" - eu posso realmente acreditar na existência de Pala, bem como de seus moradores, por que o seu sofrimento existe e é palpável. O que muda na sociedade palanesa, quando comparada com a sociedade em que vivemos, é a maneira como este sofrimento é vivenciado: não há uma luta para livrar-se da dor, de viver permanentemente em um estado forçado de alegria. Aceita-se o presente, seja o presente como for. Susie McPhail, a segunda personagem mais importante do livro, perdera o marido em um acidente de montanhismo, e frequentemente passa seus momentos solitários pensando nele, e como sente sua falta. Porém, não há nenhuma nota de autopiedade em suas reflexões, nem uma negação da realidade, e em nenhum momento ela relega sua obrigação como mãe para chafurdar na própria dor. Talvez para Skinner, o que importa na construção de uma sociedade ideal é o reforço positivo externo, o ambiente, mas será que isto não seria muito, muito mais relevante?

Pala é uma fantasia, mas pode ser tornada real. Pode ser que para que desenvolvamos uma sociedade tão avançada levemos 100 anos. Contudo, as sementes para esta utopia podem começar a serem semeadas aqui e agora, e já estão sendo. Nos meus próximos dois posts sobre Utopias, pretendo falar sobre isso. Aguardem.

quarta-feira, 27 de outubro de 2010

Fui pro Lado Esquisito da Força de vez

Quando eu estava viajando pela Patagônia junto com o Marcelo, passamos a noite em um camping em Ushuaia. Essa informação é absolutamente irrelevante para o que eu tenho para dizer, mas eu queria dizer mesmo assim por que Ushuaia é uma cidade fantástica. Em todo caso, nesse camping, tive a oportunidade de ver um magrão que, de tão esquisito, poderia estudar na UFRGS com a gente. O que mais me chamou a atenção foi que ele tinha como que uma mochila inteira para carregar temperos: vidrinhos com pózinhos, líquidos, ervas das mais diversas cores. Na época, achei estranho. Hoje, entretanto, reconheço a idéia como genial.

Decidi abraçar de vez a minha esquisitice hoje. Passando no mercado, comprei um vidro de tempero de pimenta que, junto com meu azeite de oliva e meu queijo ralado, vão andar sempre comigo em minha mochila, em um compartimento especial para carregar temperos, para, quando eu for comer no RU, eu não dependa só do sal e do vinagrete que a Mãe UFRGS me oferece. Agora, só falta eu criar barba e fazer dreadlock, por que fazer ripongagem eu já faço há tempos.

Arqueologia Musical do Self

Já falei aqui, em algum outro post, daquilo que o Marcelo chamou de "Arqueologia do Self" - seria o ato de redescobrir camadas antigas e encobertas do Self, através da leitura de diários, textos, poemas, qualquer coisa dos tempos passados.

Sempre que pensava nesse intrigante conceito, pensava apenas em leituras, produções intelectuais que ajudassem a lembrar como eram as coisas no passado. Hoje, para minha grata surpresa, percebi que também se pode fazer isso de maneira vivencial através da música. Apesar de ter ficado surpreso com essa descoberta, ela não é exatamente novidade para mim. Na verdade, a surpresa vem mais do fato de eu ter demorado tanto tempo para perceber que, ao ouvir músicas que não escuto há muito tempo, também estou desencavando não só artefatos do meu passado psicológico, mas também todo o modo de viver e sentir que operava naquela época.

Botei para tocar Underdog, do Turin Brakes, depois de um bom tempo sem ouvi-la. Conheci essa música por causa de Smallville - ela tocou ainda na primeira temporada. Ouvindo-a novamente, me recordo daquele tempo: ainda era vestibulando, morava em Caxias e ainda não tinha entrado na UFRGS. Sinto-me simultaneamente nostálgico por lembrar daquela fase da minha vida, e impressionado com quanto as coisas mudaram desde então. Nada, praticamente nada do que me preocupava à época me preocupa hoje - as paixões, os dramas, os gostos, os sonhos - tudo mudou: passei em Psicologia, conheci novas pessoas, fiz novos amigos, vivi aventuras que nunca imaginara possíveis.

Como bom contemplativo que sou, fico pensando em vários universos alternativos: seria possível voltar àquele tempo, ser de novo como eu era, viver de novo como eu vivia? Penso que não, mesmo que eu quisesse e houvesse uma máquina do tempo que me permitisse tal feito. Visto através das lentes da nostalgia, a vida que eu vivia quando escutei "Underdog" pela primeira vez não parece mais feliz, e sim mais simples. O Andarilho que eu era então continua a existir, talvez não mais ou menos feliz, mas mais forte, mais experiente, mais complexo como pessoa. Não sou hoje nem melhor, nem pior do que eu era. Tenho, porém, muitas camadas mais. Não sei explicar o que quero dizer com isso. Não sei por que, quando penso em minha evolução, penso em "camadas", como se eu fosse uma cebola. Ainda assim, sempre que acontece algo marcante em minha vida, me vem à mente uma imagem que só consigo descrever como um universo ganhando uma nova dimensão, carregada de idéias, sensações e afetos, luz e sombra, tudo isso resumido em um sorriso ao mesmo tempo nobre e triste. Quando eu tinha 18 anos, que história tinha para contar? Crescido em Caxias, estudou em escolas particulares, foi um outsider no ensino médio, viajou para os Estados Unidos e voltou para fazer vestibular. E agora, que história posso contar? Posso contar muitas, dependendo do contexto, de como me sinto e de quem me ouve. Sou múltiplo. Talvez eu sempre tenha sido, mas só agora que percebo.

Ouvindo "Underdog", me lembrei de como eu era, mas também pensei no que vou ser, e no que vou pensar quando ouvir as músicas que escuto hoje. Sou mais complexo e mais completo hoje, e provavelmente serei ainda mais daqui um ou dois anos. Como? Não sei. Só dá pra descobrir vivendo e deixando o tempo passar.

segunda-feira, 25 de outubro de 2010

Diálogo Imaginário

Estou bem tranquilo, sentado na frente do meu computador, quando escuto uma voz: "Ei, seu vadio!" A voz parece muito real, tanto, que olho para os lados e pela janela, para ver se havia alguém me chamando. "Aqui dentro, mané!" ela grita outra vez, e eu, espio em baixo da cama para ver se não havia ninguém além de mim no quarto. "Dentro da sua cabeça, animal" vociferou a voz mais uma vez, agora irritada com a minha imbecilidade. Finalmente entendo, e digo para mim mesmo: "hora de tomar gardenal, Andarilho." Com isso, a voz fica ainda mais irritada e diz "GARDENAL É REMÉDIO PRA EPILEPSIA E NÃO UM ANTIPSICÓTICO E NÃO VAI TE FAZER PARAR DE OUVIR VOZES!" Frente à uma lógica tão impecável, sou obrigado a parar de fingir que ela não existe e a escuto.

"O que foi? Alguma coisa errada?" pergunto-lhe da maneira mais cordial que consigo. Nunca antes tinha ouvido vozes, e, apesar de ser algo relativamente preocupante, não me dá permissão de ser mal educado. A voz, contudo, continuou irritada e resmungou "não vai nem perguntar meu nome? Dormi contigo por acaso?" Aturdido, retruquei "por que, se tu é um fragmento da minha imaginação? No final das contas, você sou eu" e fiquei ainda mais aturdido depois disso, por que comecei a pensar nas implicações filosóficas e lingüísticas de "você sou eu". A voz misteriosa continuou o diálogo: "que provas você tem de que eu sou um pedaço da sua imaginação? Eu poderia ser uma idéia implantada telepaticamente na sua mente" Quem ficou impaciente agora fui eu, que perguntei, um tanto rispidamente "foi pra isso que você me chamou a atenção, você que não sou eu?"

"Realmente, não foi" desculpou-se a voz. "Na verdade, vim falar contigo sobre o teu blog, o 'Espadachim Cego'. Por que você não tem atualizado ele?" Sem hesitar, respondi "por que eu tenho mais o que fazer - o estágio está tomando todo o meu tempo". "Então, por que atualizou hoje?", perguntou de novo. "Por que eu quis", repliquei. "Isso não explica absolutamente nada" a voz continuou falando, piorando ainda mais o meu humor "essa tua explicação é uma ficção explanatória, por que considera como causa última do teu comportamento algo que precisa ser explicado contextualmente - no caso, a tua vontade seria um estímulo descriminativo para algum evento ambiental que reforça teu comportamento de escrever posts para o blog". Fiquei irritado "cacete, para uma voz que não é um fragmento da minha imaginação, tu sabe demais dos livros que eu tenho lido." A voz, mais uma vez, responde "telepatia tem suas vantagens, meu caro."

Aquela resposta foi a gota d'água. "OK, agora chega! Eu vou tomar umas cinco gotas de haldol e te fazer sumir da minha cabeça, telepatia ou não!" A voz, agora visivelmente alarmada, continuou falando, tentando me dissudir de tal atitude "mas, mas... EU SOU VOCÊ! Você quer cortar uma parte tão importante de sua vida de uma maneira tão brusca? Quer, quer?" Ainda procurando o vidrinho de haldol, respondi secamente "quero, agora cala a boca e me deixa em paz." Ainda mais alarmada, a voz continuou "mas o haldol não funciona imediatamente. Vai levar alguns dias até que ele atinja concentração suficiente no teu sangue pra fazer efeito. Além disso, é cheio de efeitos colaterais. Tu quer ficar todo torto por causa dos efeitos extrapiramidais? E..." subitamente, a voz parou. Mesmo com o seu silêncio, era óbvio que ela percebera algo que a deixou muito mais assustada. Lentamente, ela voltou a falar "E desde quando tu tem um vidro de haldol em casa?". Nesse momento, respondi triunfante: "o texto pro blog é meu, e nele, o haldol funciona do jeito que eu quero - inclusive existindo em grande quantidade no armário do banheiro, mesmo isso sendo absolutamente irracional de um ponto de vista realista." Tendo dito isso, tomei o vidro inteiro de haldol e a voz, em resposta gritou "Eu voltarei! Minha vingança será maligna" antes de desaparecer completamente, como algum vilão de filme de ficção científica ruim. Então, em paz, eu saí da frente do computador e fui fazer alguma coisa de útil da minha vida ao invés de escrever textos conceituais absolutamente incompreensíveis para o resto da humanidade.

FIM

domingo, 24 de outubro de 2010

Histórias que Entretêm - A Ferida e a Pintura

Aquela não era uma ferida comum. Embora ela tivesse nascido da mesma maneira que todas as outras feridas, em encontrão brusco com a realidade que corta, queima e lacera, a dor que ela causava seguia regras próprias. Ao longo do dia, enquanto o sol brilhasse, e o mundo permanecesse agitado, ela não doía, como se já tivesse cicatrizado ou nem mesmo existisse. Porém, quando a noite e chegava tudo silenciava, a fina casca que a cobria desaparecia, e o sangue voltava a verter, nunca o bastante para matar seu dono - apenas para fazê-lo sofrer. Nestas horas, a única coisa que ocupava sua mente era estancar a hemorragia, encontrar alguma maneira de fazer a dor sumir para sempre. Obsessivamente procurava uma cura, até cansar-se e entregar-se a um sono que, se não o libertava do martírio, pelo menos lhe concedia a fugaz trégua de abandonar tudo que dizia respeito a si próprio, e voltar apenas quando a redentora luz do dia já tivesse chegado, fazendo mais uma vez a dor desaparecer num passe de mágica. Era um homem doente, o sabia, mas de um jeito sutil. Às vezes, nem ele o percebia, e pensava que tudo ia bem. Era a noite que o lembrava de sua condição enferma, de que sofria e que precisava de uma cura. 

No princípio, ignorava que mal lhe acometia. Com o passar das noites, contudo, foi se observando, e viu mais sintomas. A doença era como uma obra de arte complicada, uma pintura quase incompreensível, mas que seguia uma linha-mestre e que possuía um sentido. Pouco a pouco, foi desvendando seus traços, seus contornos, sua forma, seu todo. Contra sua vontade consciente, passou até mesmo a apreciá-la em sua beleza sofrida, de cores cinzentas, escuras e frias, que trazia em si algo de rebelde e teimoso: era sofrida, cheia de dor e mágoa, e mesmo assim, se recusava terminantemente a se macular com reclamações abjetas, indignas, mesquinhas. Lutava para manter-se digna até o final. Isso era ao mesmo tempo profundamente incompreensível e admirável.

A vista foi se tornando mais afinada, e foi encontrando coisas novas. Cada dia que passava contemplando aquele quadro, descobria uma nova ordem, como se os seus elementos tivessem se deslocado, mudado de lugar e composto uma outra pintura enquanto dormia ou olhava para os lados. No começo, a ferida estava lá, bem no meio, sangrando para todos os lados, mostrando sua dor para todos os que tivessem a capacidade (e a vontade) de ver. Mas havia mais, muito mais por se descobrir. Daquela ferida, saía a tinta que pintava o nome de uma mulher, borrado por lágrimas e cercado por espessa camada de melancolia. Quando contemplava esta parte do quadro por muito tempo, ele era imobilizado por um sentimento de inutilidade, desejava a cama, quando não a própria morte, para cair mais uma vez no esquecimento e fugir da dor. Às vezes, porém, fixava sua atenção em outra parte do quadro. Era um borrão que misturava o vermelho do ódio e da raiva com aquela cor pálida da nostalgia, não só do passado como do futuro, tingido com o tom decepcionante da falsa esperança. Quando mirava esta parte, o que lhe possuía era um enorme desejo de quebrar, destruir, causar um estrago irremediável, que amputasse sua ferida a golpes de machado cego. Era seu próprio ódio que falava - ódio não só da ferida ou daquela mulher maldita cujo nome escrevera com o próprio sangue, mas principalmente de si mesmo. Odiava-se por ser tão fraco, por também sangrar, por também sofrer, e por ter que carregar uma ferida tão humana. Esta ferida que agora carregava, já vira em outras pessoas, já causara em outras pessoas. Com elas, manteve-se nobre e distante como um médico em visita, e receitara os mesmos emplastros que hoje recusa, despreza. Ao lado do vermelho do ódio, encontrou o tom alaranjado da vergonha.

Contudo, sua vista foi se tornando mais e mais aguçada, até ser capaz de perceber, para seu espanto, que existia uma cor diferente de todas estas. Em um canto afastado, descobriu um fugaz matiz de aurora e de sol nascente. Era uma nesga pequena, quase irrelevante, mas pura e verdadeira, que não podia ser ignorada. Passou a observá-la mais e mais, e mais e mais se espantava, por que a nesga crescia, ganhava mais brilho e ainda mais cores - um azul celeste de esperança sincera, um verde claro de futuro, outro tom de vermelho, de paixão e amor pela boa briga, e um dourado fulgurante de êxtase. Foi então que finalmente descobriu que a ferida não era o centro da pintura. Pensou que fosse, por que era tudo que conseguia ver até então. No fim das contas, ela era apenas a mais recente de uma série de cicatrizes rosadas que um dia foram cortes dolorosos: também ela cicatrizaria, mais cedo ou mais tarde, e se tornaria uma lembrança entesourada de um tempo de beleza singular. Viu então, pela primeira vez, que restava muito por pintar. Uma imensidão de branco o encarava, pedia por mais tinta e o chamava à ação. Que cores usaria? Não sabia ao certo. Não iria sua ferida voltar a doer? Também não sabia ao certo. Porém, isto não importava, pois precisava continuar aquela obra, antiga e nova ao mesmo tempo. Pegou um pincel, e pôs-se a trabalhar.

domingo, 17 de outubro de 2010

Vlog

Aparentemente, está na moda ter um vlog. Pra quem não sabe, "vlog" é a contração de "Video-Log", e é como um blog, só que com vídeos. Por exemplo, se o Espadachim Cego fosse um vlog, ele não teria textos gigantescos tratando de assuntos irrelevantes, mas teria vídeos de dez minutos onde eu pessoalmente falaria de assuntos irrelevantes, como vlogs.

Criar e manter um vlog é ainda mais fácil do que criar e manter um blog, especialmente nos dias de hoje, quando qualquer idiota tem uma câmera digital de 12 megapixels: é só se filmar falando sobre qualquer coisa. Claro, como qualquer coisa desse mundo, a qualidade do conteúdo dos vlogs varia bastante, tanto quanto o da internet em geral. No Brasil, os mais famosos são o PC Siqueira e o Felipe Melo. Ambos tem um estilo bem diferente de "vlogar" - PC Siqueira é espontâneo e fala tudo o que vem na cabeça na hora de gravar, enquanto Felipe Melo obviamente tem um roteiro (e provavelmente dá uma ensaiada na frente do espelho do banheiro). Surpreendentemente, ambos alcançaram um razoável sucesso, e já podem se considerar subcelebridades nas interwebs canarinhas. Há outros exemplos por aí na internet como um todo, especialmente na parte que fala inglês - atualmente, meu favorito é o da Julia Nunes, que canta sozinha e com recursos e efeitos sonoros próprios as músicas favoritas dela, e que fica muito bom mesmo, mas também tem o clássico That Guy With The Glasses, e o infame Red Letter Media, que são sites mais focados em fazer reviews de filmes (usualmente detonando eles da maneira mais violenta possível - tão violento quanto a internet pode ser).

Olhando todos esses exemplos de sucesso, bem como outros exemplos de fracasso, cheguei à uma conclusão: eu posso ter um vlog também. Qual seria o assunto principal desse vlog? Sei lá. Qualquer coisa que me interessasse por mais de 15 segundos. Teria roteiro, script, seria ensaiado? Olha, como bom cientista humano, seria semi-estruturada: começa com alguma coisa ensaiada e depois descamba para a putaria o improviso. Alguém iria olhar? Provavelmente meu pai, que depois de duas semanas ia começar a reclamar que eu não atualizo de chega (tipo o blog). Seria um vlog engraçado? Para algumas pessoas, provavelmente. A única certeza que tenho é que eu ia me divertir fazendo isso. Aliás, já teria feito se soubesse como usar a câmera do meu laptop.

quinta-feira, 30 de setembro de 2010

Mochilas, bolsas e outras porcarias que carregam porcarias

Depois de ler o post da Vane sobre como ela prefere mochilas a bolsas femininas, resolvi escrever um texto sobre isso também. Não por que eu não goste de usar bolsas, mas por que tenho o que dizer sobre mochilas, considerando todos os anos de experiência usando diversos tipos de modelos.

Como disse, já usei muitos e muitos tipos de mochilas, inclusive alguns que seriam mais adequadamente classificados como bolsas. As mais clássicas são aquelas que a gente usa para ir pra escola quando pequenos: coloridas, cheias de compartimentos para coisas pequenas e grandes, com um desenho da Mônica e do Cebolinha na parte da frente. A maneira de carregá-las variava conforme a época. Quando eu entrei na primeira série do fundamental, não havia muita frescura: bota no lombo e leva todas as tuas porcarias pra aula. Ou, para ser mais exato, passa as tuas porcarias pros teus pais carregarem, e vai correndo pro pátio brincar com os coleguinhas. Depois, lá pela terceira ou quarta série, começou a moda de mochilas com rodinhas. A explicação por trás delas é que carregar mochilas pesadas nas costas prejudicava o desenvolvimento postural dos pimpolhos, e portanto, levar os materiais escolares em um carrinho de mão seria muito mais saudável. Pessoalmente, eu acho que isso foi invenção de pais cansados de
 carregarem as tranqueiras pelos filhos, que queriam um jeito de não ter que carregar cadernos, livros, lápis e canetinhas (em sua maioria inúteis, por que só usávamos as canetinhas para colorir), ou sofrer menos na hora de carregar.

Não lembro quando parei de usar "mochilas de carrinho", mas lembro que voltei a usar mochilas de botar nos ombros, como também tive um flerte rápido com bolsas do "tipo carteiro". Ela é usada em um só ombro, com uma alça relativamente grande, e, apesar de ser chamada de "bolsa", ela não é feminina. Aliás, ela pode ser bastante máscula.

Apesar da pesquisa no Google indicar o contrário

O problema é que, para carregar os cada vez mais pesados materiais escolares numa bolsa dessas é o que os psicólogos chamam de "pedir pra se foder". Eu fiz isso, e um belo dia, caminhando para a aula, a alça da bolsa se arrebentou sem mais nem menos. Não que fosse algo surpreendente, considerando todos os livros, cadernos e outras porcarias que, apesar de continuarem sendo inúteis mesmo no ensino médio, eu era obrigado a levar todos os dias para a aula. Fiquei um pouco traumatizado com esta experiência, e só voltei a usar esse tipo de bolsa, e a perceber sua utilidade, esse ano, quando viajei para o nordeste. Todos os participantes do Encontro Nacional de Estudantes de Educação Física (ENEEF) ganharam uma capanga, que é basicamente uma bolsa de palgodão cru. Como eu estava lá para fazer turismo e dormir em um lugar barato, ganhei uma também. Apesar de ser bastante bagaceira (vamos e viemos, era só algodão cru), achei ela bastante prática e cômoda para levar minhas coisas, mais até do que a minha mochila. Porém, admito que era uma coisa do contexto - comparado com Porto Alegre e Caxias do Sul, Fortaleza é uma cidade muito mais relaxada e quente, o que torna o ato de carregar mochila algo bastante desconfortável, e torna o uso de capangas muito mais atraente.

Porém, com a exceção desse breve período no nordeste usando capangas, durante todo meu tempo de faculdade, eu só usei mochilas. Aliás, dificilmente consigo sair pra rua sem uma. Atualmente, tenho duas, mas uso realmente uma só, daquelas de carregar notebook. Como a Vane mesmo disse, elas são muito práticas, pois são cheias de divisórias, além de serem espaçosas. Com ela, eu posso carregar tanto meus livros (nunca saia de casa sem pelo menos três - vai que a fila do banco seja especialmente morosa hoje), quanto meus papéis - polígrafos, prontuários e comprovantes autenticados de matrícula - e o eventual pen drive, bem como meu porta escova de dentes. De vez em quando, levo uma muda de roupa, que fica por cima dos livros, mas isso é bem lá de vez em quando.

Por fim, falta falar sobre o último tipo de mochila que uso: a cargueira. Uso esse tipo só quando viajo e tenho que levar minha casa nas costas - várias mudas de roupa, tênis reserva, material de higiene, saco de dormir... enfim, a tranqueirada toda. Elas são muito práticas, entretanto, trazem consigo o pequeno inconveniente de necessitarem re-organização constante, especialmente em viagens longas, para que não machuquem tuas costas com coisas em lugares inadequados (por exemplo, cabo de panela nas costas é bem pouco confortável). E, com elas, a pérola de sabedoria da Vane de "não levar mais de 5kg no lombo" é sumariamente ignorada. No meu último dia na Bolívia, caminhei pelo menos uns 8km por Santa Cruz de la Sierra com uma mochila que eu pensava pesar 15kg, mas que no aeroporto descobri pesar 20kg. Por sorte, já conheço muita gente da Fisioterapia pra futuramente consertar minhas costas. Minha cargueira já tem mais de dez anos, e continua servindo muito bem aos meus propósitos, mas há modelos mais recentes que são realmente muito bons. Nenhuma é no formato do R2D2, mas são legais também.

Para o Infinito e Além

O trampolim estava logo ali, na minha frente, a uns dez ou vinte metros. Para vencer essa distância, apenas uma rápida corrida é necessária. No entanto, se tudo se resumisse à corrida, seria muito mais fácil. Precisava encontrar a velocidade certa - não muito rápido, para não perder o controle, nem muito devagar, para ter energia cinética o suficiente - fazer o tempo certo e a movimentação certa - como fazer para pular no trampolim sem perder o embalo, e como utilizá-lo adequadamente?

Todos estes cálculos passam pela minha cabeça muito rapidamente, em menos de cinco segundos. Claro, para ter pensamentos tão ágeis, ajuda o fato de eu já ter repetido esse processo várias e várias vezes, ainda que várias e várias vezes sem sucesso, em dois aparelhos diferentes. "Ginástica Artística envolve muita cognição, pessoal" disse o professor cinco minutos antes. Essa afirmação me tranquiliza, não sei bem por que. Talvez a palavra "cognição" torne tudo muito mais familiar, fácil de compreender. Tiro da minha memória de longo prazo uma de minhas estratégias metacognitivas e, enquanto espero minha vez para correr até o trampolim e pular no fosso acolchoado, ensaio mentalmente minha performance: me vejo correndo, em velocidade adequada, rumo ao trampolim. Num rápido e suave movimento, faço a transição do solo para o aparelho, e me projeto para o ar. Ainda em minha mente, insiro as correções que o monitor, o professor e os colegas me sugeriram: menos projeção para frente, mais projeção para cima, tomar cuidado com a posição das pernas, pois elas devem ir dobradas, e não estendidas. Por fim, caio nos colchões azuis, e em pé. Pelo menos na minha imaginação, fui bem sucedido. Agora, só restava fazer isso na vida real.

É chegada a hora. A pessoa que estava na minha frente na fila acabara de fazer sua tentativa. Não sei se ele ou ela conseguiu fazer um salto mortal e cair em pé, e naquele momento, pouco importava, pois toda minha energia tinha um único foco, o meu próprio salto mortal. Reviso rapidamente todo o processo - tantas coisas para fazer em menos de cinco segundos! Olho para o professor uma última vez, para ter certeza de que ele está prestando atenção em mim. Espero um sinal, algo que me diga "pode ir", enquanto pensamentos ricocheteiam dentro do meu crânio. Oliva, o professor, olha para mim e balança a cabeça. É a hora. Os pensamentos que antes me incomodavam desaparecem como num passe de mágica. Não há nada acontecendo em meu organismo que não seja o preparo para salto mortal. Minha mente e meu corpo tornaram-se um só através da ação.

Racionalmente, sei que tudo não passou de um breve momento, mas, relembrando todo o processo, parece uma eternidade. Antes de ir, digo "agora vai!", como que em desafio ao Deus do Fracasso que se intrometera em todas as minhas tentativas anteriores. Corro, salto com os dois pés para cima do trampolim e subitamente me vejo no ar. Nos poucos segundos que tenho ali em cima, sou tomado pela certeza de que eu estou voando, ou pelo menos "caindo com estilo". A gravidade faz seu trabalho, e logo começa a me trazer para o solo. Encolho as pernas e projeto meu quadril. Caio sobre os meus dois pés no colchão, e tão rapidamente quanto posso, olho para o professor e perguntou "fiz certo?" Dessa vez, ele diz que sim.

Saio do fosso, e a tarefa do dia está terminada. Acabou. Eu, porém, continuo pensando nela. Eu quero mais, eu quero voar outra vez, ainda mais alto. Para o Infinito e Além!

terça-feira, 28 de setembro de 2010

Crônicas de um Restaurante Universitário

Estou no meu estágio outra vez, e, como como surgiu uma folguinha, decidi escrever aqui no blog outra vez sobre meu assunto favorito: o RU. Eu sei, eu sei, dizer que RU é meu assunto favorito é o mesmo que dizer que o Clodovil era afrescalhado. Tenho a impressão que toda vez que eu digo "oi, vou falar do RU hoje" vocês reagem da mesma maneira aos Testemunhas de Jeová que batem na sua porta e perguntam "posso te falar sobre Jesus?" A diferença entre eu e os Testemunhas de Jeová é que eu não bato na sua porta pra falar do RU (e se eu fizesse, seria por que eu não tomei meu antipsicótico) - na verdade, quem vem ler minhas ridículas opiniões sobre o Restaurante Universitário da UFRGS é você, então eu não sei por que estou me justificando aqui.

Mas, voltando ao assunto, minha opinião é clara: o RU é do caralho. Tudo que se refere à esta instituição, se não me faz ficar feliz por ter vindo estudar em Porto Alegre, pelo menos me faz rir, como o estranho hábito que todo calouro da UFRGS desenvolve de descascar laranjas com colheres. Eu até fiz um trabalho de Antropologia sobre essas coisas! E hoje, mais uma vez caminhando do ambulatório para meu almoço, percebi: o RU me transformou em mais um esquisitão da UFRGS, por que nunca, de maneira alguma, um restaurante em Caxias do Sul, mesmo o RU da UCS me faria achar que andar com um vidro de azeite de oliva e outro de queijo ralado dentro de um pote de sorvete da Kibon de baixo do braço seria algo normal. Mais engraçado ainda, ninguém dentro do RU achou estranho - bom, pelo menos ninguém me abordou e perguntou "ô amigo, que porra é essa?", o que já é sinal de alguma coisa.

Outra coisa que me chamou a atenção hoje foi a fila: não havia uma. Quero dizer, havia uma sim, mas nada que se compare com as monstruosidades que já vi por aqui ainda esse ano. Com a reforma e a expansão do RU aqui do Vale, não é mais necessário esperar 40 minutos na fila para poder comer o feijão com arroz mais maravilhoso do mundo - hoje fiquei menos de 5 minutos, isso considerando toda a embananação que me deu ficar segurando o pote de sorvete da Kibon. Contudo, apesar de ficar maravilhado com isso, não pude deixar de notar que o bandejão estava funcionando no limite de sua capacidade. Como nos meus tempos de bixo no Campus Saúde, era plenamente possível encontrar lugar para todo mundo se servindo, mesmo estando todas as cadeiras ocupadas, por que o fluxo de clientes é ágil o suficiente para que as pessoas se sirvam, sentem, comam e vão embora, deixando seus lugares para os que chegam depois.

Esse é um equilíbrio delicado, especialmente se considerarmos a época em que vivemos. Agora, eu posso ir almoçar às 12:30 e não ficar com cãimbra de esperar em pé, mas cada começo de semestre pode jogar tudo isso pelos ares. Logo depois que virei veterano, criei o saudável hábito de, no início de cada semestre, passar do lado da fila do RU usando a roupa que mais me deixasse com cara de mendigo louco, fazendo cara feia e dizendo "malditos bixos" e algumas ameaças, para ver se a fila diminuía mais rapidamente. Mas aquela era uma época mais simples, quando o REUNI não existia, e a possibilidade de um curso novo brotar da terra era inexistente. Agora, todo ano, somos confrontados com o risco de alguma unidade criar uma graduação nova, como Massagem Erótica, que, além de roubar mercado da Fisioterapia, atravanca a fila do RU com mais bixos e mais pessoas comendo no RU. São tempos difíceis.

Outra coisa difícil são as prefeituras dos campi, e as decisões que elas tomam. Por exemplo, esses dias, voltando para casa, tomei um atalho e passei do lado do RU da Saúde. Descobri então que colocaram uma grade em volta do restaurante. Por que? Não faço a menor idéia, mas eu acho que é para atrapalhar todo mundo, por que a entrada agora só pode ser feita por um lado da rua, e justamente o lado mais difícil.

Por fim, por que eu escrevi esse post? Por nenhum outro motivo além de que o RU é, realmente, do caralho, e merece mais um post aqui para atestar isso.

quarta-feira, 22 de setembro de 2010

Ginástica Artística Aplicada à Linguagem

Hoje apareceu um comentário anônimo num post meu falando sobre uma gíria portoalegrense, dizendo que curtiu o texto, e que eu deveria escrever mais textos sobre outras expressões idiomáticas utilizadas por aqui. Apesar de ter gostado das sugestões, fiquei com vontade de escrever um pequeno post sobre uma expressão que nasceu faz pouco tempo, provavelmente vai ser esquecida pelo público em três dias, mas que eu achei o máximo e vou utilizar quando encontrar o contexto apropriado: Salto Triplo Carpado Hermenêutico.

Estava eu no twitter, tocando minha vida como de costume, quando olho os Trending Topics Brazil, os assuntos que estão bombando nos tuíteres tupiniquins, e vejo essa frase. Obviamente, me assustei, por que a palavra "Hermenêutica" só pode ser utilizada em duas situações: 1) em um contexto acadêmico, discutindo a relevância da obra fenomenológica-existencial de Merleau-Ponty para a filosofia contemporânea e 2) quando um assassino profissional aponta uma arma para sua cara e pergunta quais são as suas últimas palavras, e você tenta enrolar ele para te manter vivo. Como eu considero discussão de Merleau-Ponty o equivalente intelectual de um apocalipse zumbi, as duas situações supracitadas são de vida ou de morte - hermenêutica não é uma palavra que se usa assim, como quem fala cu.

Então, fui procurar no Google essa expressão no Google, para descobrir se ela surgiu de algo que apareceu na mídia, ou foi alguma campanha viral para promover a nova edição de "Fenomenologia da Percepção", ou um meme criado por algum intelectual entediado como eu. E eis que, pela primeira vez em muito tempo, a realidade é mais satisfatória que a ficção: encontrei esse link aqui explicando tudo. Não vou ficar resumindo a notícia pra vocês por que ela é bem curtinha, e vou dizer só o seguinte - é mais genial do que eu imaginava. Por isso, acho uma pena que essa expressão, ao contrário de bestialidades como "né brinquedo, não!", "óia a faca!" ou qualquer outra coisa que o Zorra Total tenha produzido em seus dez anos de existência, não vire um meme em seu pleno direito, e se torne parte de nosso vocabulário, nem que seja por um mês apenas.

Assim sendo, concluo, através de um Salto Triplo Carpado Hermenêutico, que nós devemos divulgar essa expressão por todo o Brasil, mesmo que ninguém entenda o que ela significa.

quarta-feira, 4 de agosto de 2010

Experiências Cinemáticas - O Exterminador do Futuro II

E, conforme prometido, acabei de assistir "O Exterminador do Futuro II". E, conforme eu não tinha prometido, vou escrever uma resenha sobre esse filme também, aproveitando que ele está fresco na minha memória.

Como eu disse no post anterior, todo mundo já assistiu "O Exterminador do Futuro II" pelo menos algumas vezes na Tela Quente, ou qualquer outro programa de filmes da TV aberta - eu também, tanto que minha lembrança de certas cenas é bastante antiga. Ainda assim, assistir esse filme tendo assistido sua "preqüência" faz toda a diferença. Talvez não tanto em termos de história, já que é plenamente possível vê-lo e entender tudo sem ter visto o número 1, mas sim para fazer algumas comparações.

Fica claro, pelo menos para mim, que o primeiro filme da franquia tinha um orçamento muito menor do que o do segundo. Como apontou um anônimo nos comentários do post anterior, James Cameron era apenas um ilustre desconhecido quando lançou "O Exterminador do Futuro". Certamente ele não poderia ter na época os mesmos recursos dos quais ele dispunha na produção e gravação do segundo filme. Não vejo isso nem como bom, nem como ruim. Entretanto, isto certamente afeta o desenvolvimento da trama.

É muito comum na indústria cinematográfica acontecer o que o TV Tropes chama de Real Life Writes the Plot - isto é, a Vida Real Escreve a Trama. Nos casos em que isto acontece, o diretor, ou quem quer que seja o responsável pelo roteiro, é obrigado a fazer mudanças na história por que algum problema de gravação ou produção não permite que a idéia original seja posta em prática. O próprio "Exterminador do Futuro" foi vítima disto: James Cameron queria que o filme fosse uma guerra de robôs, o que implicava em vários robôs ao mesmo na tela. Entretanto, como ele não tinha cacife para bancar uma coisa dessas, resolveu adotar uma outra abordagem: pegar um ator de verdade, ou, na falta disso, Arnold Schwarzenegger, dizer que ele é um robô do futuro com pele humana e por ele a caçar uma pessoa nos tempos de hoje. Qual história é mais impactante? O filme teria sido melhor se James Cameron contasse desde o início com todo o dinheiro e recursos do mundo no primeiro filme do Exterminador? Francamente, é difícil dizer, mas, na minha opinião, a história que ele nos contou, sobre um andróide extremamente humano que vem do futuro eliminar nossa última esperança é muito mais cativante (e assustadora) do que robôs lutando contra robôs, e talvez Cameron não fosse o titã hollywoodiano que é hoje com ela, nem Schwarzenegger governador da Califórnia.

O fato é que, muitas vezes, a vida real escrever a trama, e mudar o que o diretor tinha em mente de alguma forma, é uma coisa positiva, por que acaba limpando o roteiro de idéias ruins, e substituindo-as por outras mais dinâmicas. E, quando o diretor tem poder demais sobre o filme, este processo acaba não acontecendo. Dizem por aí que este é o principal motivo para os novos filmes da saga de Star Wars serem tão inferiores à trilogia antiga - como George Lucas tinha todo o dinheiro do mundo, toda a tecnologia e ninguém para lhe dizer coisas como "hey, George, a trama está muito ruim e não faz sentido", "sério cara, você está muito preocupado com efeitos especiais" e "por favor, mata esse coelho retardado com sotaque jamaicano", os erros fundamentais da trama não foram eliminados.

Quero dizer com isto que "Exterminador do Futuro II" é ruim por que dispôs de dinheiro demais para sua filmagem, e que Cameron deixou o poder subir à cabeça? Não. Na verdade, apesar de achar o primeiro filme da série muito melhor, sua continuação é também excelente. Quero apenas apontar que a quantidade de recursos disponíveis afeta de maneiras imprevisíveis a produção de um filme. Fica óbvio que, além de ter mais pilas pra gastar, Cameron também tem objetivos muito mais ousados com "Exterminador do Futuro II". Com o primeiro, ele tinha que se preocupar apenas em lotar os cinemas e convencer as pessoas a irem às locadoras pegar em VHS. Ele conseguiu, e com um sucesso retumbante. Agora, com este filme que acabei de assistir, ele não se preocupava mais com isso - ele sabia que o sucesso comercial para ele era líquido e certo. Como ele fez ano passado com "Avatar", ele se dedicou ao desenvolvimento de novas tecnologias cinematográficas, como técnicas de animação digital mais avançadas, de filmagem e também de narração. O resultado? Outra obra-prima. Tenho que dizer que, polêmico do jeito que é, James Cameron é um mestre no que ele faz. O que ele faz? Duas coisas: contar histórias e ganhar dinheiro contando essas histórias. Talvez alguém poderia acusá-lo de ser "clichê" ou "manipulativo", por usar tantos símbolos e temas emocionalmente carregados para a grande parte da humanidade, mas eu considero isto parte de sua genialidade. Em "Exterminador do Futuro", ele abordou nosso medo de sermos destruídos por nossas próprias criações, ao mesmo tempo humanas e monstruosas; na seqüência, ele continuou com este tema, e o expandiu, colocando a velha questão "podem máquinas aprender a amar?" em pauta mais uma vez. Pode ser exagero meu chamá-lo de filósofo; porém, os seus filmes contém muito daquilo que poderia se chamar filosofia, e fazem os espectadores pensar de maneiras diferentes.

"Exterminador do Futuro II" não é melhor do que seu antecessor, mas se sustenta sozinho brilhantemente e, em alguns momentos, até mesmo supera o primeiro filme. As cenas de ação, na minha opinião, apesar de serem mais bem montadas, simplesmente por causa do excesso de dinheiro disponível, não são tão boas quanto as do primeiro, que passa melhor a idéia do desespero por trás de uma luta contra máquinas. Ainda assim, são muito boas, e te deixam, 20 anos depois da estréia, em um permanente estado de expectativa por John Connor e sua família. As expressões faciais de tronco de árvore de Schwarzenegger são muito bem utilizadas, e sua interação com o jovem John Connor, que acaba vendo-o como um pai, são de fazer muito marmanjo chorar (não que tenha acontecido comigo, claro). Por fim, Linda Hamilton reprisando o papel de Sarah Connor está fantástica. Quem mais fica impressionado com sua atuação é quem viu o primeiro filme, e é tomado pela sensação de "quem te viu, quem te vê": de moça simpática que trabalha num restaurante, à máquina destruidora que faz de tudo para proteger seu filho e treiná-lo para ser um grande líder militar, ela é muito convincente.

Então, se você não viu esse filme, além de sair de baixo dessa pedra onde você está morando nos últimos 20 anos, eu recomendo que você assista os dois primeiros filmes da série "O Exterminador do Futuro" em seqüência, por que vale muito à pena.

segunda-feira, 2 de agosto de 2010

Experiências Cinemáticas - O Exterminador do Futuro

Olá mais uma vez, meus queridos! É com alegria que volto a escrever aqui no blog depois de quase um mês de ausência. Tenho, todavia, uma boa desculpa, por que, desta vez, ao invés de não escrever nada aqui por que estava sendo meramente preguiçoso, eu estava sendo meramente preguiçoso no norte e no nordeste do Brasil. A mudança geográfica, que aconteceu por causa do Encontro Nacional de Estudantes de Psicologia (ENEP) e do Encontro Nacional de Estudantes de Educação Física (ENEEF), torna minha inatividade mais facilmente justificável, visto que não tinha computadores sempre à disposição como tenho aqui em casa, e que precisava pagar para utilizar aqueles que estavam por perto. Além disso, acho um tanto quanto chato ficar escrevendo e pensando em textos para o blog enquanto viajo. Mas eu não vim aqui só para justificar minha falta de atualizações. Venho aqui hoje com o propósito de escrever sobre cinema.

Senti vontade de assistir uns filmes este final de semana, e então, passei na locadora e peguei dois: "Star Wars - Uma Nova Esperança" e "O Exterminador do Futuro". Sobre "Star Wars" não há muito o que falar, ou melhor dizendo, há muito o que falar, mas não é o que eu quero falar a respeito. Sou muito fã da série, tanto que peguei o filme pela enésima vez, mas acho que, justamente por tê-lo assistido tantas vezes, seu impacto foi muito diferente de ter assistido "O Exterminador do Futuro" pela primeira vez. Pois é, hoje foi a primeira vez. Todo mundo já assistiu o segundo filme em alguma noite chata na "Tela Quente", muita gente já viu o terceiro e tenho minhas razões para crer que bastante gente viu o quarto filme (por que o personagem principal é o Batman). Agora, quem assistiu o primeiro, aquele que deu origem à série? Também muitas pessoas, mas a maioria delas é do tempo que a Rita Cadillac era a "Rainha do Bumbum" - ainda estou por encontrar alguém com menos de 35 anos que viu o filme. O que é uma pena, por que ele é muito bom.

Antes de falar mais aprofundadamente do filme, gostaria de falar sobre alguns aspectos contextuais dele. Segundo o Internet Movie Database, "O Exterminador do Futuro" estreiou nos cinemas em 1984, a mais de 25 anos. Para fazer uma comparação tosca, eu tenho 21. Muita coisa mudou nesse tempo: os computadores ficaram mais modernos, as roupas ganharam outras cores, os penteados ficaram menos ridículos e o filme bombou e entrou para a cultura pop como um marco. Hoje, todo mundo sabe de onde saiu a imortal frase "I'll be back", que John Connor vai liderar a resistência humana contra os robôs no futuro apocalíptico e que Sarah Connor é dura na queda. Em outras palavras, o final do filme hoje é de conhecimento geral. Obviamente, não era assim quando o filme entrou em cartaz no cinema, e por alguns anos depois de já ter saído. Assistir o filme hoje, mesmo que pela primeira vez, não causa o mesmo impacto que causaria em 1984, por causa de todos estes motivos que listei acima, e isto é muito perceptível. Quando o filme começa, sabemos que os dois caras que aparecem pelados no meio de uma tempestade elétrica são do futuro, e que um é humano e um é andróide. Só isso. Podemos inferir que eles são inimigos com base no gênero do filme e na Lei de Conservação dos Detalhes (por que mandariam duas pessoas do futuro, se não fosse para elas se pegarem no soco?), e que o fortão é um andróide por que ele é o mais racional e metódico, igual a uma máquina, e por que ele arranca com as mãos o coração de um punk. Entretanto, aposto que muita gente na época deve ter pensado "puxa, como esse magrão é forte". Também demora um pouco para ficar claro que o que eles querem fazer está relacionado à uma mulher chamada Sarah Connor - mas o que eles querem com ela? Protegê-la? Matá-la? Fazer sexo grupal com ela? De novo, pode se inferir com base nos mesmos princípios citados anteriormente, mas ainda é pura intuição. E por que eles querem ela especificamente?

O filme vai, lentamente, respondendo a cada uma dessas perguntas: o loiro, chamado Kyle Reese, é um soldado humano do futuro, enquanto que o moreno fortão é um andróide. Reese foi enviado para proteger a mesma mulher que o andróide exterminador foi enviado para matar. Esta mulher, Sarah Connor, é o alvo de tanta atenção por que ela será a mãe do futuro comandante da resistência contra os andróides, que no futuro dominam o planeta e buscam com todas as forças destruir os humanos que sobreviveram à guerra nuclear. Só bem no final, descobrimos que Reese é na verdade o pai de seu comandante, que o mandou não só para proteger sua mãe, como também para ser seu pai de fato.


E o filme conta tudo isso em um ritmo incansável e envolvente, que não te deixa parar para pensar e ficar de saco cheio. Aliás, mesmo nos momentos que eu parei para ir no banheiro e pensei, não fiquei de saco cheio. Pelo contrário, me senti ainda mais empolgado com a história. Obviamente, assistir um filme passados 25 anos de sua estréia é uma experiência prejudicada por do que a influência que ele exerceu na cultura: outros elementos também acabam fazendo com que ele pareça velho. Por exemplo, as músicas que tocavam durante as cenas de ação são anos 80 demais para mim. As idéias de como fazer filmes de ação da época, bem como aquelas sobre música, mudaram dramaticamente. Para uma pessoa nascida depois de 1988, "O Exterminador do Futuro" parece um filme lento, com uma trilha sonora composta por arquivos .MIDI vagabundos. Na minha opinião, o filme envelheceu bem, e só alguém muito chato e cabeça oca diria que ele é chato. Entretanto, as diferenças permanecem.

Por fim, gostaria de dizer que, embora considere o primeiro "Exterminador do Futuro" o melhor de toda a série, ele fica melhor ainda depois de se assistir o segundo (que também é muito bom, diga-se de passagem). No primeiro, Sarah Connor é uma mulher normal, que trabalha num lugar meio podre, sai para a balada com a melhor amiga e praticamente borra as calças quando percebe que tem um assassino em sua cola. No segundo, porém, a história é outra: ela é uma máquina de combate, e treina seu filho para ser ainda melhor do que ela para enfrentar seu terrível destino. Essa mudança começa ainda no primeiro filme, quando ela destrói sozinha o que resta do Exterminador (com direito a um One Liner "you're terminated, fucker!") e depois vai para o México comprar armas. Realmente foderoso.

Enfim, "Exterminador do Futuro" é um bom filme, e recomendo a todos que ainda não o assistiram a corrigir este terrível erro em suas vidas o quanto antes, por que foi relançando em DVD, para que nós, filhos do século XXI, possamos assisti-lo em toda sua glória. Vou aproveitar o embalo e os últimos dias de férias para assistir os outros filmes da série, mesmo que não sejam tão bons assim, só pra ver a história evoluir.

domingo, 4 de julho de 2010

A Finaleira do Semestre

Fazer faculdade é tudo de bom, especialmente se tu estudas em uma universidade graúda como a UFRGS - tu tens acesso a livros de graça aos montes através das bibliotecas, faz grandes amigos nas cadeiras, descobre festas bisonhas nos lugares mais estranhos possíveis, compra cerveja barata e conhece um monte de gente bonita e inteligente. Daí chega o final do semestre e tu te lembra por que tu entrou para a faculdade para início de conversa: aprender um ofício.

OK, talvez "aprender um ofício" seja uma maneira capitalística demais de dizer qual a função do ensino superior, além de ser também restrita demais: socializar, conhecer gente nova e se divertir são alguns dos objetivos da faculdade, mas eles são dependentes, pelo menos em parte, da parte séria dela - estudar, fazer trabalhos, fazer provas, passar nas cadeiras e eventualmente se formar e ganhar um diploma.

O grande problema do final de semestre é que ele surge subitamente. Você está lá, bem feliz, lendo seus livros, saindo com seus amigos, dando em cima daquela sua colega bonitinha, quando, de repente, você olha sua agenda e percebe que precisa fazer 5 trabalhos e estudar para 4 provas na mesma semana. Diante de tão tenebrosa missão, você calcula quanto tempo dispõe para fazer tudo de maneira organizada, saudável e que te permita continuar se divertido adequadamente, e conclui que não tem tempo pra mais porra nenhuma. Você até elabora uma escala de horários, se planeja, faz tabelas, promessas e juramentos à Santo Expedito e à Santa Rita de Cássia, e tem certeza de que, se aderir a elas, vai dar tudo certo, mas, então, acontecem duas coisas. Ou você adere, e não dá certo, ou você não adere, e não dá certo também. Por que, veja bem, só há uma coisa certa no final do semestre: você vai se ferrar por causa dele. Então, parafraseando aquele velho ditado, "em caso de prova de Neuroanatomia ou trabalho de Avaliação Psicológica, relaxe e goze!"

Não vou dizer para não se preocupar com o final de semestre, e o tsunami de responsabilidades que vem junto com ele, mas também não vou dizer para você deixar de se divertir por causa dele. Lembre-se, Deus não fez o mundo em 6 dias - ele ficou de coçação por 5 dias e ficou a madrugada inteira do sexto trabalhando. Faça você o mesmo. Agora, com licença que eu tenho mais quatro trabalhos pra entregar terça-feira...

sexta-feira, 2 de julho de 2010

Copa do Mundo II

Brasil perdeu o jogo contra a Holanda. Por um lado, isso é triste, mas, por outro, isso faz com que meu time preferido de todos os tempos deste ano fique mais próximo de ganhar o copa.

FORÇA PARAGUAI!

quarta-feira, 30 de junho de 2010

Quando o Semestre Acabar...

... Eu vou ter um volume obsceno de tempo livre, e não vou saber o que fazer com ele. Prevendo este problema, aqui vai uma lista das coisas que eu pretendo fazer com meu superávit de coçação de saco:

1) Assistir "Tropa de Elite" e "Cidade de Deus";
2) Fazer uma maratona de "Star Wars" e "Star Trek";
3) Ir para o Encontro Nacional de Estudantes de Enfermagem;
4) Ir para o Encontro Nacional de Estudantes de Psicologia;
5) Ler "The Once and Future King";
6) Ler mais Jung, Adler e Freud;
7) Ir mais vezes na Redenção;
8) Ir no Gasômetro perder meu tempo;
9) Ir no Fantaspoa;
10) Comer pastel na Venâncio Aires;
11) Treinar Kung Fu com mais calma;
12) Chamar amigos para ver filmes e comer porcarias;
13) Ler mais sobre Desenvolvimento Humano;
14) Assistir "De Volta para o Futuro";

terça-feira, 29 de junho de 2010

Psicopatologia da Vida Cotidiana no RU

Comi no RU hoje. De novo. Nessas alturas do campeonato, isso não é novidade pra mais ninguém, principalmente pra tia do RU, que me avisa qual caixa eu devo me dirigir. Também não é novidade para ninguém o quanto eu gosto do pudim do RU. Todo mundo que lê esse blog sabe que isso que eu chamo de "pudim" na verdade é uma pasta cremosa, colorida, doce e gostosa, e que eu fico muito feliz quando tem isso no cardápio do dia. Agora, uma coisa que pouca gente sabe é que, quando tem pudim no RU, eu também fico paranóico. Basicamente, meu medo é: se eu deixar minha bandeja aqui e for buscar meu suco (ou água, como tem sido bastante freqüente aqui no Campus do Vale), será que alguma dessas pessoas aqui sentadas não vão meter a colher na minha sobremesa? Eu deixo minha bandeja, vou até o lugar onde se pega o suco, mas vou e volto pensando nisso, tanto que inspeciono atentamente a massa açucarada que há na minha bandeja, para ver se não há marcas de colheres alheias, ou uma diminuição no volume total de gostosura.

Outra coisa que me deixa paranóico em dia de pudim: será que eu ganhei menos pudim que os outros? Eu olho atentamente enquanto a funcionária do RU coloca a minha porção do dia, e depois, comparo com o que os outros freqüentadores do estabelecimento ganharam. Geralmente, acho que ganhei a mesma quantidade, fico feliz e esqueço disso. Entretanto, se desconfio que alguém foi mais abençoado que eu, ou a média da população, fico "cabreiro", como diria o bom e velho Boça. Fico pensando em perseguir esta pessoa, descobrir o que há de especial nela, o que ela faz para merecer tamanha graça, enfim, tento responder a pergunta "PORQUE NÃO EU? PORQUE? Ó SUPREMA INJUSTIÇA!"

...


Exceto nos dias em que eu sou agraciado com uma dose levemente maior do que os demais. Nesses dias, eu gosto de imaginar que alguém que passou do meu lado, olhou para a minha bandeja e pensou "esse cara deve ser especial pra ganhar tanto pudim assim".

No ajojo

Vindo morar em Porto Alegre, eu acabei mudando minha maneira de falar. Claro, não cheguei a adotar completamente o sotaque do Bom Fim, que é ali do lado da minha casa, nem abandonei por completo meu sotaque de gringo da Serra, tanto que largo um "poca voya", "brodo", o clássico "porco ziuna" e o inconfundível "pede pra fulano se não é verdade. Aprendi, no entanto, uma série de termos novos, que creio serem utilizados somente aqui, na Capital.

O primeiro termo foi "teto". Para qualquer outro cidadão desse país, teto é aquela parte da casa que fica sobre sua cabeça. Para o portoalegrense, "teto" também é uma divagação mental, uma "viagem". "Bah meu, tava aqui tetiando sobre ir morar no Canadá e me prostituir pra ganhar a vida" é um exemplo do termo utilizado como verbo. "Teto Véio Loco" é uma maneira particularmente engraçada e enfática de dizer que uma divagação é mais fora do normal que... o normal.

Há também a palavra... OK, talvez eu não tenha aprendido tantas palavras novas assim aqui em Porto Alegre, mas eu queria dar uma enrolada antes de falar da gíria "Ajojo". Para ser sincero, não sei se eu já não conhecia essa aberração gramatical antes de vir morar aqui. Porém, sei que só comecei a dar valor para seu uso por aqui, quando percebi que dizer "tô ajojado" é uma maneira bem descritiva de dizer "estou me sentindo ao mesmo tempo cansado, retardado e incapaz de realizar qualquer tarefa mais complicada que bater com a cara na mesa." Além disso, "ajojado" é engraçado como aquelas palavras que seu afiliado de 3 anos fala na ceia de Natal - quando ele diz é bonitinho, quando você diz, é mongo. Eu me divirto com esse tipo de situação. Prefiro que as pessoas pensem que eu tenho algum tipo de déficit cognitivo, e que eu seria incapaz de escrever meu nome sem trocar alguma letra de lugar.

quinta-feira, 24 de junho de 2010

Sociologia da Copa do Mundo

Neste exato momento, eu deveria estar borrando minhas calças de preocupação por  causa do meu trabalho de Introdução à Sociologia, que apresento hoje à noite e ainda não está totalmente pronto. Entretanto, como eu sou um indivíduo bastante tranqüilo, e como o trabalho vai bem, obrigado, decidi falar de Sociologia em outra área: Copa do Mundo.

Copa do Mundo é um prato cheio pra chamar o brasileiro de alienado, por que é só nessa época que ele se mostra patriota para alguma coisa, e ignora todas as notícias que não contenham a palavra "futebol". O Kibe Loco postou um comentário da notícia que o Judiciário está tentando passar um reajuste de salário para seus funcionários que de tão alto é inconstitucional. Eu poderia falar sobre isso, e sobre milhares de outras coisas que estão acontecendo de ruim no Brasil, mas prefiro falar sobre o esporte mesmo.

Este ano, não estou dando muita bola para a Copa, pelo menos se comparado com as copas anteriores. Em 1994, eu era pequeno demais para entender que diabos estava acontecendo, mas acompanhei os jogos mesmo assim por que todo mundo estava, inclusive as professoras da minha creche, que arranjaram uma TV e nos botaram para torcer pelo Brasil contra a Suécia (o que foi bem confuso, para ser sincero, por que o Brasil estava com o uniforme reserva, que é azul, e a Suécia estava com um uniforme amarelo - o que é demais para a cabeça de um menino de 5 anos compreender). Devo ter visto a final contra a Itália, porém não lembro nada a respeito dela.

Em 1998, a coisa foi bem diferente. Com dez anos, os neurônios responsáveis por jogar futebol já tinham atingido o zênite de seu desenvolvimento e eu era um perna de pau consumado. Ainda assim, acompanhei a Copa na França com paixão, assistindo todos os jogos do Brasil, preenchendo as tabelas de resultado num encarte da Veja e sendo 100% brasileiro em época de copa. Lembro até hoje que foi o Brasil quem abriu o evento, numa partida meio xexelenta contra a Escócia, que teve gol contra e frescurite generalizada. Eu fiquei esperando os escoceses entrassem em campo com os rostos pintados de azul, levantassem seus kilts e mostrassem suas partes púbicas para a torcida canarinho, e ganhassem a partida só na base da humilhação moral. Infelizmente, isto não aconteceu.

Ele deveria ter sido técnico da Escócia.

Lembro-me também da deprimente final contra a França, quando o time brasileiro tomou 3 gols de uma seleção que parecia ganhar os jogos só por que estava em casa (mas aposto que se eles tivessem encarado a Alemanha, teriam perdido por W.O.), do Ronaldo Fenômeno, ainda no auge da forma física, ficar fazendo merda em campo e todas as discussões que eu tive com a professora de português sobre como os resultados para a França ganhar serem tudo "cartas marcadas". Outra coisa que eu nunca esqueci foi a humilhação de ter que aguentar os franceses poderem tirar com a nossa cara por causa do 3X0, e desde então, sempre fiquei muito feliz quando a seleção da França perdia qualquer coisa, mesmo que fosse campeonato de cuspe à distância, e ficava ainda mais feliz quando eram derrotados por uma diferença de 3 ou mais pontos (múltiplos de 3 contam).

Em 2002, a coisa foi mais complicada. Não me lembro de ter assistido todos os jogos, por causa do fuso horário infeliz - afinal de contas, a Copa estava sendo realizada no Japão e na Coréia do Sul, que ficam do outro lado do mundo. Em algum momento, contudo, eu fiz parte da infame "Torcida Coruja" da RBS, e fiquei acordado até às 3 da manhã, empoleirado do lado da TV assistindo qualquer jogo que fosse. O mais marcante dessa copa foi o sentimento de que já tínhamos perdido, antes mesmo dela começar.

O Brasil só se classificou à muito custo, enquanto a Argentina tinha detonado nas Classificatórias, e por isso, tudo referente à nossa seleção era alvo de críticas, principalmente as escolhas do técnico Felipão, que se recusara a chamar Romário para compor a equipe. Já nessa época eu comecei a desenvolver um certo asco daqueles quadros da Globo onde um repórter vai para a rua perguntar qual seria a seleção perfeita, e ver um monte de Zé Ninguém falar como se soubesse mais do assunto do que quem está envolvido com a preparação técnica dos jogadores. Ainda assim, esta foi uma copa muito, muito feliz. Depois de um começo duvidoso, enfrentando times de pouco brilho como China, Turquia e Costa Rica, o Brasil foi avançando, ganhando partidas e confiança, até chegar na final e ter sua vez de entufar uma seleção européia. Infelizmente, não foi a França, e sim a Alemanha, que naquela copa tinha o melhor goleiro de todos, Oliver Kahn.



Kahn, se me lembro bem, só tinha levado 1 gol, em toda a copa, e chegou a dizer que, "jogador boml é aquele que marca quando ELE está na goleira". Tubarão morre pela boca, e a Alemanha perdeu a final de 2002 por 2 a zero. Foi lindo, e tudo ficou mais lindo por que a França, que começou a Copa já se achando campeã, foi desclassificada ainda na primeira fase. Me senti vingado. BRASIL-SIL-SIL! Uma última coisa sobre a Copa do Japão e Coréia. Apesar da Turquia ser um time pouco representativo no futebol mundial, sua seleção jogou muito naquele ano. Na primeira fase, os turcos perderam para os brasileiros por questão de detalhe - aquele tipo de detalhe que vai parar na justiça esportiva por aqui. Porém, como bons inimigos valorosos que os turcos são, eles também se classificaram para as oitavas de final, e nos confrontaram outra vez nas semifinais. Eles foram com sangue nas ventas, querendo vingança pela injusta derrota sofrida. Perderam de novo, mas desta vez não houve dúvida: o Brasil mereceu ganhar.

Enfim, 2002 foi um ótimo ano para ser patriota: Brasil pentacampeão, derrotamos a Alemanha e a França tomou na bunda. 2006 na Alemanha ia ser lindo também, não é? Bem, não foi. Desta vez, foi o Brasil quem entrou de salto alto em campo, e fomos desclassificados nas quartas de final. E, injúria das injúrias, contra os franceses, outra vez! Lembro que tinha recém voltado dos EUA, e estava um pouco indiferente à copa, mas acompanhei pelo menos o jogo contra a França, e, quando ela ganhou, eu torci contra ela pelo resto do mundial. Só fiquei um pouco em dúvida em torcer contra ela na final contra a Itália por que, se a Itália ganhasse, ela seria tetracampeã, e ficaria mais próxima do Brasil em termos de conquistas. Felizmente, Zidane e Materazzi me fizeram esquecer esses detalhes, e nos deram este lindo meme da Cabeçada no Plexo Solar, e eu pude esquecer os detalhes irrelevantes como, quem ganhou a copa.

K.O.!

A derrota em 1998 foi triste, mas não vergonhosa. O mesmo não pode ser dito de 2006. Os jogadores do Brasil se portaram mal durante a copa, jogaram de salto alto e pareciam não se importar em terem perdido ou não. Parreira, então o técnico, que começou a copa com a bola toda, terminou demitido e desmoralizado. Aliás, todo mundo que integrou a seleção em 2006 saiu assim, e não sei de ninguém que conseguiu sair dessa fossa depois.

Exceto o Ronaldo.

OK, falei de todas as minhas copas. Falta a de agora. Bem, é a primeira copa do mundo que ocorre na África, e é a primeira que eu não vi um jogo sequer do Brasil. Sim, eu escutei as vuvuzelas (que pra mim nunca deixarão de ser cornetas), os foguetes, as comemorações dos vizinhos, as pessoas torcendo no Bar do Antônio por algum time obscuro, mas até agora, em nenhum momento eu me prestei a ligar a televisão e ver como a Esquadra Canarinho está se saíndo. O que eu me dei o trabalho de fazer, no entanto, foi o de olhar de tempos em tempos a tabela de resultados no Google. Estou muito feliz com os resultados, por que:

1) França foi desclassificada na primeira fase. De novo.
2) A Itália foi desclassificada na primeira fase. Também.
3) Muitos times sul-americanos se classificaram para as oitavas de final.
4) Muitos times que nunca ganharam copas do mundo se classificaram, como Portugal e Espanha.
5) França foi desclassificada na primeira fase. De novo.
6) Brasil se classificou antecipadamente para a próxima fase.
7) Dunga está mostrando para a Rede Globo quem é que manda. Ele vai se ferrar, mas o que conta é a intenção.
8) Já falei que a França foi desclassificada na primeira fase de novo?

A Alemanha se classificou, e pode ganhar outra copa do mundo e voltar a se igualar à Itália (que foi desclassificada, também, como a França), mas penso que nesta copa teremos resultados diferentes. Gostaria de ver uma seleção diferente ganhar a Copa, e parece que este ano temos uma alta probabilidade disto acontecer.