quinta-feira, 15 de maio de 2008

O Desafio da Existência

Existe, na Filosofia, uma corrente de pensamento chamada Existencialismo. É uma corrente antiga, que pode traçar suas origens ainda em Sócrates. Para falar bem a verdade, não é justo chamá-la de corrente, movimento ou ideologia: não há um Existencialismo, mas tantos diferentes quanto pessoas que por ele simpatizam. O Existencialismo é algo como uma filosofia de vida, não um código de conduta, mas um eterno lembrete de que somos mortais, limitados e imbecis, que nosso tempo nesta terra é curto e que não temos certeza se há algo nos esperando após a morte. Para um existencialista, a vida após a morte pouco importa – o que temos é o aqui e o agora, e o que vamos fazer com isto.

Acho o Existencialismo muito belo. Qualquer um que ler Nietzsche, Kierkegaard ou Sartre pela primeira vez pensará como eles são pessimistas, vêem a vida como um poço de sofrimento sem fim e que não há como fugir disto. Mas é este desespero que nos motiva a ir além do que somos, transcender a nós mesmos e aproveitar o tempo que temos – “fazer o que fazemos com o que fazem conosco”. A frase que melhor define este desespero produtivo é “estamos fadados a sermos livres” de Sartre. Este filósofo era realmente pessimista em seus textos, mas ainda assim ele defendia que o Existencialismo é a mais otimista de todas as filosofias, por acreditar na capacidade do ser humano decidir seu próprio destino (2).

Há uma diferenciação na filosofia entre correntes essencialistas e correntes existencialistas. Grosso modo, os essencialistas tentam definir o que significa ser humano, o que está no âmago de nós mesmos, enquanto que os existencialistas defendem que nossa existência cria nossa essência. Existe um certo antagonismo entre as duas formas de pensar, mas acho que isto seja bobagem. Sartre dizia que “a existência precede a essência”, mas também acreditava que nossa liberdade é meramente situacional, em que temos que escolher. Não vejo nenhuma contradição entre estas duas afirmações, pois é nas situações em que somos forçados a uma escolha que definimos nossa essência, apesar de já antes de nascermos termos pelo menos 50% de nossa personalidade determinada.

Os existencialistas em geral escrevem sobre angústia, náusea, desespero e doença, e acredito que não haja no mundo filósofos melhores do que eles para falar destes assuntos, pois eles realmente os vivenciaram. Entretanto, isto também os torna capazes de falar do outro lado da moeda. Nietzsche disse certa feita que não havia ninguém no mundo melhor preparado para falar sobre saúde do que ele, pois ninguém no mundo havia vivido tanto tempo de sua vida doente como ele viveu. Por trás dos textos desesperados, há uma mensagem de esperança. Para os existencialistas, o mundo é um lugar triste e mau, mas com um grande potencial para ser feliz e bom. Para que possamos transformá-lo, devemos primeiro transformar a nós mesmos, purificar-nos de nossos hábitos ruins e nossos preconceitos para então modificar o mundo. Na verdade, isto não é estanque como deve ter soado, pois o mundo muda ao nosso redor na medida em que nós mudamos. O mero desejo de transcender a si mesmo nada muda, mas ativamente buscar esta mudança faz uma grande diferença.

Para mim, o existencialismo é um convite, um desafio para crescer. Vivo em um mundo doente, desesperado e indiferente ao sofrimento alheio, mas estou a poucos passos de um lugar onde a saúde, a esperança e a compaixão governam, e depende apenas de mim mesmo fazer esta travessia. Abandonar o passado tenebroso para buscar o futuro brilhante através de um presente verdadeiro e criar uma existência nova das cinzas da antiga. Este é o desafio da Existência.




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1. As duas frases entre aspas neste parágrafo são de Sartre, mas não queria abrir um parênteses ali e quebrar a linha de pensamento ali presente com algo irrelevante.

2. O outro lado da moeda é o Humanismo, que também acredita na liberdade humana, só que é muito mais positivo em suas afirmações. Sartre escreveu um texto cujo título é “O Existencialismo é um Humanismo”, onde ele mostra que não existem tantas diferenças assim entre as duas “correntes”.

Justice for All

Uma noite de sono decente, finalmente.