Pode parecer piada (e se não parecesse, não estaria escrevendo a respeito disso aqui), mas cozinhar ovo é mais difícil do que se pode imaginar. OK, é só colocar os ovos na água e pôr para ferver, mas como eu vou saber que já posso desligar o fogão e tirá-los da panela? Geralmente quando tenho uma dúvida dessas ou eu pego o telefone e ligo para minha mãe perguntando da forma mais objetiva possível, ou pesquiso no Google. Este último, apesar de não ter o carinho de mãe, é anônimo, e poupa muitos constrangimentos (por que, convenhamos, cozinhar ovo é provavelmente o nível mais baixo de conhecimento culinário).
E, não sendo isso o bastante, eu encontrei um blog chamado Culinária Masculina, e que tem por objetivo explicar "tudo o que um homem sempre quis saber daquele cômodo cheio de azulejos que não é o banheiro", mas que até o advento da internet não tinha coragem de perguntar para ninguém.
Para minha grata satisfação, um dos posts desse blog era justamente sobre a arte de cozinhar ovos. O texto falava das coisas simples, mas não tão óbvias para nós, turistas da cozinha, sobre esta refinada prática, e elucidava minha principal dúvida: 15 minutos e ficava pronto. Com este conhecimento em mãos (e considerando que cozinhar ovos no microondas deve ser o equivalente culinário de colocar Mentos numa garrafa de Coca-Cola), enchi a leiteira de água, coloquei os ovos e liguei o fogo. Diferentemente dos pastéis e demais frituras, que demandam a presença constante do cozinheiro, quando se cozinha algo pode-se abandonar a comida ao seu próprio destino e ir fazer alguma outra coisa, até que ela fique pronta. No meu caso, fui para a sala e fiquei lendo. Apesar de mais confortável do que os pingos de óleo fervente que voam para todos os lados quando se frita pastéis, a experiência de esperar os ovos cozinharem é muito mais perturbadora, pois é inevitável escutar o barulho da água borbulhante, os ovos colidindo uns com os outros e pensar "será que essas porcarias não vão explodir e esmerdalhar encher a cozinha de dejetos?" (não seria a primeira vez que faço algo parecido na cozinha).
Depois de 15 minutos passados, tirei os ovos do fogão, e comecei o lento processo de descascá-los. Este ponto marca a passagem da fase dramática do processo para a fase patética, pois meus esforços podem muito bem serem assim qualificados. Começou na hora de despejar a água quente na pia e deixar os ovos esfriarem, tarefa que imaginava demandar muito tato e delicadeza, pois os ovos poderiam se quebrar. Tirei a leiteira do fogão e equilibrei-a na borda da pia. Como o cabo por onde a segurava estava muito quente, peguei um paninho para segurá-la sem me queimar. Isso acabou se provando mais inútil do que o imaginado, pois acabei esbarrando na leiteira e derrubando-a dentro da pia. Apesar da lambança, foi até melhor deste jeito, pois me poupou o trabalho de ficar segurando a panela como alguém segura um recém-nascido (metaforicamente falando, pois bebês não saem de fábrica com alças plásticas. Infelizmente).
Peguei os ovos, coloquei-os novamente na leiteira, e a enchi de água fria, pois era essa a sugestão do Culinária Masculina para que esfriassem. Passado mais um tempo (preciso dizer que fui para a sala ler de novo?), comecei a descascar os ovos. O que é muito, muito chato, pois ficam pedacinhos de casca, bem pequenos, presos no ovo, que não podem ser removidos sem destroçar um pedaço da clara. Além disso, é um trabalho repetitivo e que não permite quase nenhuma abordagem mais criativa. Quero dizer, eu até poderia inventar um jeito mais emocionante de tirar a casca, como jogar os ovos na parede, mas isso implicaria em mais sujeira, que implicaria em mais faxina por minha conta, que é coisa que eu evito sempre que possível.
Enfim, segui assim, tirando tanto quanto era possível da casca dos ovos. Tinha planejado guardá-los para fazer sanduíches mais tarde, mas como estava com fome e sou impaciente, simplesmente os comia quando considerava que já estava descascado o suficiente (não que eu não tenha pensado em comê-los com casca mesmo. Essa porcaria deve ter cálcio, ou alguma coisa saudável do genêro e que justificaria seu consumo). Enquanto comia o terceiro e último dos ovos cozidos, saí para a área de serviço para respirar o ar da noite, e senti um cheiro de comida vindo de algum apartamento mais abaixo. Era o cheiro de uma refeição completa, feita por alguém que domina minimamente os preceitos da culinária. Dei a última mordida na minha saborosa janta e pensei "merda. Um dia eu aprendo a cozinhar".