segunda-feira, 1 de setembro de 2008

Crueldade e Ética na Internet

Hoje tive a graça de entrar no blog Ballastexistenz, que há tempos não lia, e dei de cara com o texto "Internet Eugenics". Certamente o título do texto chamou minha atenção, mas quando comecei a ler, percebi que ele era baseado grandemente em um outro texto, "The Trolls Among Us". Resumidamente, eles falam sobre um assunto muito antigo e muito humano, a crueldade humana, mas em um contexto relativamente recente, a internet.

Na famosa rede mundial de computadores, nasceu e existe uma subcultura, cujos membros são chamados de "trolls". Trolls são pessoas que se divertem incomodando os outros, escrevendo comentários intencionamente ingênuos, irrelevantes ou irritantes, com o objetivo de ver as reações alheias, e ver quem cai na brincadeira. Nos primórdios da internet, nos anos 1980, ficava só por isso mesmo, mas atualmente a coisa é muito mais séria: há casos de bullying pela internet, violação de propriedade e ameaças de morte. Bem, não acho necessário ficar relatando estes causos em detalhes, pois está tudo nos artigos que linkei aqui. O que importa aqui é que coisas muito violentas acontecem, e tudo por que alguns indivíduos querem dar umas risadas - they did it for the lulz. Não que isto seja algo inédito na história da humanidade, mas o fato de que qualquer pessoa com uma conexão à internet, um pouco de paciência e disciplina e muita vontade de fazer mal aos outros possa fazer isto, e de forma absolutamente anônima é sem precedentes.

Coisas como estas fazem pipocar na minha mente o velho argumento de que o ser humano é uma criatura essencialmente má, anti-social e egoísta que precisa refrear seus impulsos mais profundos e verdadeiros, sublimá-los em formas mais positivas e altruístas de comportamento para ser-lhe permitido viver em sociedade e portanto sobreviver e perpetuar seus genes. Não tenho certeza se Freud foi o primeiro a desenvolver este argumento, mas certamente seus artigos e pontos de vista são os mais conhecidos no mundo inteiro, seja por cientistas sociais ou pessoas leigas no assunto. De forma grosseira e sucinta, concordar com Freud é aceitar que as pessoas consideradas mais puras por nós são na verdade as mais desonestas de todas, e que nossa espécie não tem salvação, pois eventualmente os nossos desejos mais profundos serão libertados, e destruiremos a nós mesmos.

Mas além de lembrar-me do velho Sigmund, estes textos fizeram-me relembrar um outro texto que li em um blog por aí, "Fragmentos da Sociedade Virtual", do Saíndo da Matrix. Neste artigo, o autor fala de sua experiência como jogador de um Massive Multiplayer Online Role-Playing Game (MMORPG), Lineage II. Como nos dois textos anteriores, o assunto deste artigo são as relações sociais criadas no jogo, que funciona de muitas maneiras como uma feira livre medieval, com livre comércio, lutas com monstros demoníacos e interação entre jogadores. O autor fala que é como ver uma sociedade, primitivamente sem regras, formar-se e estabelecer códigos de conduta próprios. E, no jogo, a prática de atacar outros jogadores é desencorajada de todas as maneiras: você não ganha nem experiência, nem dinheiro, e seu nome fica marcado em vermelho, indicando que você é um PK (Player Killer). E, apesar de todas estas desvantagens, sempre existem PKs. Sempre há quem esteja disposto a matar seus iguais apenas por poder fazer isto. Fazendo um pequeno paralelo com a sociedade, é um fenômeno parecido com a Sociopatia, que em longo prazo, não traz nenhum benefício para ninguém, nem para a sociedade, nem para o sociopata. Isto poderia ser apontado como mais uma prova da maldade intrínseca do ser humano. Mas, neste mesmo jogo, existem pessoas heróicas, que arriscam suas vidas para caçar os PKs, e contribuir para o bem comum. E mesmo em assuntos menos dramáticos, a boa vontade e a sinceridade parecem ser mais a regra do que a exceção ali. Os MMORPGs seguem regras próprias, mas estão sempre subordinados às regras sociais humanas mais amplas, pois nada mais são do que grandes aglomerados de pessoas, convivendo e buscando seus próprios objetivos. E lembro-me de Carl Rogers, que dizia que a essência mais verdadeira do ser humano é positiva e boa, sendo a maldade apenas a distorção dos nossos impulsos mais profundos, de amor e crescimento.