sexta-feira, 29 de abril de 2011

Ser Humano

Tigre preso
Em gaiola de papel
Gaiola essa
Que ele mesmo escolheu

Nostalgia, Perda e Dor

Acho que uma das muitas coisas que crianças, e às vezes adolescentes, não entendem é a nostalgia. Por terem caído aqui no mundo a muito pouco tempo, tudo parece não apenas novo, mas também eterno - as coisas sempre foram assim desde que elas se conhecem por gente. Porém, as crianças crescem, as coisas mudam, e quando elas percebem, sentem falta. No que parece pouco tempo atrás, as pessoas falavam da década de 1980 com esse sentimento de falta. Eu nunca fiz isso por que, poxa vida, eu nasci em 1988, e não vi nada das coisas interessantes daquela década. A década de 1990, contudo, é outra história: eu tive minha infância nessa época, e sou culpado de todos os crimes que as crianças cometiam naquela época.

Um dia desses, vi aquele vídeo no YouTube onde crianças (de hoje) são apresentadas a objetos que eram usados 20 ou 30 anos atrás, como disquetes, fitas cassete e telefones de discar, e tinham que adivinhar para que serviam. Enquanto elas faziam suas apostas (algumas bastante próximas), eu me dei conta que eu sabia exatamente o que cada uma daquelas porcarias fazia, por que eu cresci com elas! Eu me senti não só velho, como também saudoso daquelas coisas - me peguei dizendo para mim mesmo "aquela época sim é que era boa", e desejando voltar a um tempo onde celular era coisa de grã-fino e se podia sumir na rua sem nenhum esforço se assim se desejasse, a internet não existia e todos os amigos que moravam longe se comunicavam por cartas. As coisas eram mais difíceis de se conseguir, e por isso muito mais belas, por serem mais raras, e o esforço daqueles que as procuravam era muito mais merecedor de elogio do que é hoje.

Pelo menos na minha cabeça.

No mesmo momento em que eu flagrei este fragmento de desejo, eu pensei "que bobagem, pelo amor de Deus." Continuei sentindo, pensando, imaginando como o mundo era mais bonito em 1990 por que me fazia (e ainda faz) me sentir bem, mas o meu senso de honestidade comigo mesmo me trouxe, como um secretário diligente, todos os dados que eu sei a respeito da década de 1990, da tecnologia e do mundo em geral. Obviamente as coisas não eram melhores 20 anos atrás - os meios de comunicação, além de ser de menor qualidade, eram totalmente controlados por três famílias; comprar livros era uma coisa que só se fazia em cidade grande e dos títulos que estavam disponíveis ali no estoque da livraria; amigos que moravam longe trocavam cartas, mas depois de um tempo qualquer um enche o saco de ficar escrevendo à mão (ou na máquina de escrever) e esperando os Correios levarem tua mensagem; e apesar do meu romantismo a respeito de todo o lance de "sumir nas ruas sem o celular", eu sei quão chato, pra não dizer trágico e desesperador, pode ser uma pessoa desaparecer sem deixar vestígios. Além de tudo isso, existe o fato de que a tecnologia, toda ela, era muito inferior à que temos hoje, desde aparelhos de som até os modelos de psicoterapia e saúde mental. Resumindo, mesmo que fosse possível voltar ao estado tecnológico de 20 anos atrás, não seria desejável, muito menos vantajoso, fazê-lo por que estamos muito melhor hoje (pelo menos neste sentido).

Então, tenho essas duas coisas acontecendo ao mesmo tempo dentro de mim - a nostalgia e a idealização do meu tempo de criança, junto com a clara noção de que estou vendo o passado através de lentes cor-de-rosa. Afetivamente, eu anseio pelos meus tempos de infância, e racionalmente, eu prefiro os dias de hoje. Por que? Não quero que a resposta para esta pergunta seja excessivamente emotiva, nem racionalista ao ponto de ser psicologicamente aleijada. Ambas as reações, por mais discrepantes que sejam, estão corretas, por que foram construídas a partir de informações coletadas de modos muito diferentes. É como a eletricidade, que é ao mesmo tempo corrente alternada e luz contínua, ou os fótons, que são simultaneamente onda e partícula. É um paradoxo, uma pergunta que não precisa de resolução, e sim de uma síntese.

Hoje, esse homem de 22 anos que escreve para este blog, racional e analítico, consegue ver as vantagens que o progresso científico trouxe para a humanidade e para si mesmo, pois ele lembra das dificuldades que ele e outras pessoas enfrentaram por não existirem tecnologias suficientemente avançadas em sua infância. Por outro lado, ele sente falta daquele tempo por que, quando ele era criança, ele era inegavelmente feliz. Viver era simples, uma grande brincadeira que só acabava quando precisava dormir. Os problemas a resolver eram simples, e quando não se conseguia fazer algo, as "pessoas grandes" ao seu redor o ajudariam. Não existia pressão, nem questões de vida ou morte. Hoje, porém, parece que o mundo vai desabar a qualquer momento sobre minha cabeça; as questões com que me deparo são, sim, de vida e morte, e são tão complicadas que não existe mais nenhuma "pessoa grande" que possa resolvê-las, a não ser eu. A brincadeira acabou, e é no sono que eu encontro meu descanso. Se meu intelecto percebe que muitas coisas mudaram para melhor de 20 anos para cá, meu coração percebe que muitas outras também mudaram, e mudaram para pior.

Essa semana, meu pai disse que era muito mais fácil lidar comigo quando eu tinha cinco anos, por que eu era uma criança feliz. Eu não engolia sapos ou levava desaforos para casa, por que eu não sabia como fazer isso. As ofensas batiam em mim, mas eu logo esquecia delas, por elas simplesmente não serem parte da brincadeira. Porém, em algum ponto. eu aprendi a engolir sapo, e deixei de ser uma criança feliz para ser... adulto, talvez. Nesse ponto, algo se perdeu, a brincadeira acabou e eu me tornei igual a todas as outras pessoas no mundo. Maturidade? Ser maduro é ser "normótico"? Eu acho que não - apenas seguir os outros apenas por que não se sabe para onde ir é mau sinal, especialmente se as pessoas que você segue também não sabem para onde vão (aquele adesivo de carro "não me siga, também estou perdido" é mais verdadeiro do que pode parecer num primeiro momento). Algo se perdeu, se rompeu, se foi, e eu fui expulso do Paraíso, que agora busco sem achar. Alguém pode me indicar o caminho? Eu não sei.