quinta-feira, 19 de fevereiro de 2009

Sobre o tempo e relógios esquisitos

Morei e cresci em Caxias do Sul por quase toda minha vida, mas desde que comecei a faculdade em Porto Alegre, há dois anos, não tenho sido muito diferente de um turista, vindo para a cidade natal em alguns finais de semana e logo voltando para a capital para continuar os estudos. Dá para perceber que minha relação com a cidade mudou de morador para visitante só pela organização sintática do meu texto - eu volto para Porto Alegre de Caxias do Sul, e não o contrário.

Esse distanciamento me faz ver Caxias de outros ângulos que antes me eram inacessíveis. Quando se vive em um lugar, não se nota suas mudanças, apenas paulatinamente. Devargazinho, um detalhe que outro muda, até que, 10 anos depois, já não se vive mais na mesma cidade, apenas no mesmo local. Agora, quando apenas se visita um lugar, todas as mudanças são - ou parecem - bruscas. Não por que sua presença mágica faz com que as coisas se transformem de repente, mas como você não estava por aqui acompanhando os detalhes mudando a passo de formiga, vê apenas o resultado, e não o processo. Hoje tive esse impacto pelo menos duas ou três vezes.

Caxias do Sul é o pólo industrial mais importante do estado, mais do que a própria capital, arrisco dizer, atrái muitos investimentos e pessoas, e por isso muda muito rapidamente. A última vez que estive aqui e pude ver o centro da cidade com mais calma foi a quase um mês. Dá tempo para muita coisa mudar, ou, pelo menos, parecer muito diferente. Logo na rodoviária, quando desci do ônibus, percebi que as coisas por lá estão mais arrumadas, bonitas. Não gosto de rodoviárias e acho todas elas feias e sujas (por que são mesmo), e a daqui de Caxias parecia mais limpa do que de costume. Claro, fizeram uma rampinha bonitinha ao lado do desembarque, colocaram uns vidros bonitos e pintaram as paredes de branco com detalhes em azul e amarelo. Da última vez que desci lá, só havia poeira e cimento para todos os lados. Eu poderia ligar os pontos e pensar "olha, terminaram a reforma", e de fato fiz isso, mas só depois que o impacto do local estar tão diferente ter passado.

Depois, já fora da rodoviária e no centro da cidade, atravessando a Sinumbu, do lado da praça Dante Alighieri, vejo uma coisa estranha naquele pedaço de calçada no meio da rua. À primeira vista, parecia um daqueles relógios que também dão a temperatura, só que mais afrescalhado. Numa inspeção mais atenta, percebi que era quase isso - era uma bomba-relógio um marcador contando quantos dias faltam para a Festa da Uva de 2010. 364 dias até o grande festival de terra, pão e vinho com o qual eu não poderia me importar menos. Da última vez que passei por ali, ao contrário do que aconteceu no caso da rodoviária, não havia nada que indicasse a futura aparição do Inri Cristo e seus anjos do Apocalipse daquele trambolho prateado. Eu sei que para ele aparecer ali ocorreu todo um processo, desde a liberação da prefeitura até a construção do mecanismo e sua eventual fixação anal ao solo, mas para eu que só vi ele hoje, parece que ele caiu de alguma nuvem no céu. Foi ali, naquele momento quando todas estas coisas fervilharam em minha cabeça, que este post nasceu.

E, ainda impressionado com como as coisas mudam, quase chegando ao lar, vi que pintaram uma das casas aqui da rua de um verde bem chamativo, ao contrário da cor antiga, apagada demais até para eu lembrar. Ficou bonito. Sábado estarei indo gerundicamente para Paraíso, a praia onde passei todos os verões de minha infância. Faz pelo menos um ano desde a última vez que estive lá, quando tive o choque de descobrir muitas coisas mudadas. Provavelmente há mais novidades que caíram do céu me aguardando por lá para me surpreenderem.