domingo, 13 de abril de 2008

Psicoterapia para todos

Como disse em um post anterior, bons psicoterapeutas empregam práticas durante o tratamento de seus pacientes, não importa sua vinculação teórica, e que estas “estratégias profundas” são utilizadas por pessoas comuns, mas com uma maior sensibilidade em suas vidas cotidianas. E que, muitas vezes, psicólogos tornam-se bons clínicos apesar da teoria que seguem, quando não se tornam clínicos ruins por aterem-se demais à ela. Foi provavelmente isso que levou Carl Rogers a dizer que seria mais proveitoso selecionar terapeutas ao invés de treiná-los. Neste post não pretendo falar mais a respeito da Psicologia Positiva, mas com sua ajuda teórica e prática, falar a respeito de um assunto que venho pensando a respeito faz um bom tempo.

Em uma reportagem do New York Times, foi mostrado um caso na Índia em que pessoas sem formação anterior em psicoterapia são educadas para identificar sintomas e indicadores de transtorno depressivo maior e transtorno de ansiedade em outros e em si mesmo. As formas como estas doenças se manifestam em países ocidentais e orientais é bastante diferente, especialmente no caso da depressão. Apesar das diferenças óbvias que existem entre países ocidentais e orientais na forma de expressar sentimentos (o que influencia a sintomatologia destas doenças nas duas culturas), o caso da Índia é excelente exemplo de política pública a ser implantada no Brasil. Aqui, os detentores do conhecimento de cura são os psiquiatras e psicólogos, que foram devidamente treinados para reconhecer indícios de que alguém padece de um transtorno mental. Mas não existem tantos psiquiatras por aí, e apesar de ter psicólogo se formando a bangu por aí, eles não são onipresentes e oniscientes, e muitas pessoas que sofrem neste exato momento por uma condição que poderia ser tratada não são diagnosticadas, e continuam sofrendo. Por que as faculdades de psicologia ao redor do Brasil e do mundo não seguem o exemplo deste psiquiatra de Goa, e oferecem cursos rápidos de capacitação em identificação de transtornos mentais como a depressão, a ansiedade e outros transtornos de humor e afeto?

Poderíamos começar modestamente e capacitar pessoas que lidam diretamente com o sofrimento alheio. Penso especificamente em líderes de congregações religiosas, como padres, que frequentemente são abordados por seus irmãos de fé em busca de conselhos e orientação. Padres católicos fazem isso com freqüência maior do que outros sacerdotes, por causa de sua obrigação de tomar confissões de qualquer um que entrar em sua paróquia. Além disso, acredito que pessoas que seguem a vida religiosa são em geral mais compassivas, e que seu posicionamento estratégico em comunidades beneficiaria muitos outros (a título de curiosidade, Rogers foi seminarista antes de entrar para a faculdade).

Por ser uma capacitação breve, não seria ensinado muita coisa, até por que existem pessoas que fazem faculdade especialmente para aprendê-las. Se fosse montar um currículo para um curso desses, daria rudimentos de diagnóstico ateórico, baseado no DSM, algumas técnicas e um pouco de teoria de Terapia Cognitivo-Comportamental e Logoterapia, além de um pouco de Psicologia Positiva. Seria superficial, mas seria o suficiente para melhorar a vida de quem está deprimido, ou pelo menos de conduzi-los a um psicoterapeuta. Além disso, as referências seriam fornecidas, permitindo aos interessados em se aprofundar no conteúdo buscar mais leituras e orientação.

Dependendo dos resultados obtidos, poderia se transformar o projeto temporário em algo mais definitivo, voltado para a população em geral.

Viktor Frankl, criador da Logoterapia, buscava tornar sua teoria mais conhecida e abrangente, de forma que mesmo leigos pudessem utilizá-la em suas vidas, tornando-as mais saudáveis e significativas. Entre os princípios da Terapia Cognitivo-Comportamental, está a psicoeducação do paciente a respeito de seu transtorno e do tratamento cognitivo, da mesma forma que projetos que poderiam ser considerados como parte do movimento da Psicologia Positiva tentam promover educação emocional e social em lugares chave, como escolas primárias. O problema metodológico mais óbvio de um experimento como esse seria a mensuração de sua eficiência: como é que eu vou saber se treinar os padres é mais eficiente que treinar as velhas carolas que vão colocar dinheiro na caixinha do altar, ou se não vale a pena perder tempo com isso? Afinal, dificilmente os beneficiados por este projeto vão se manifestar (seja por vergonha ou por não fazerem a menor idéia de tal experimento). Poderia se instruir o líder religioso a pedir feedback aos seus irmãos de fé, após dar-lhes conselhos, mas esta pode ser uma prática altamente reativa, e que poderia influenciar no resultado do experimento.

Em todo caso, é uma medida simples, mais barata do que 5 anos de faculdade de Psicologia (e 10 de faculdade de Medicina e residência em Psiquiatria), mais abrangente e que possibilitaria uma melhora na qualidade de vida de muitas pessoas. Vale a pena pôr em prática.

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