sábado, 26 de abril de 2008

Meu trabalho

Passei a noite em claro escrevendo este trabalho para o curso de Intervenção Social. Acho que cometi falhas que normalmente não cometeria, devido ao cansaço (que, aliás, nem é tão grande assim). Entretanto, acho que está bom o bastante para ser entregue. E mesmo que não estivesse, eu entregaria da mesma forma, por que não é uma disciplina, é só um curso, portanto o máximo que pode acontecer é eu não receber o certificado de participação. Enfim, gostaria de um feedback, se possível. E trabalho meu tem mais referência ao Maslow do que cerca tem chuchu.

Intervenção Social: Riscos, cuidados e possibilidades

Pode parecer redundante, ou até mesmo desnecessário para um trabalho final de curso, começar falando dos objetivos que foram perseguidos desde o começo até esta dissertação. “Intervenção Social: Promovendo protagonismo e bem-estar na juventude” é um título muito claro: buscamos, através de intervenções sociais, promover entre jovens (crianças e adolescentes) a prática de comportamentos assertivos, e que se alcance um bem-estar, seja físico ou psicológico, através de tais atos. Logo nas primeiras aulas, ficou claro que as referidas intervenções aconteceriam em um contexto bem diverso da universidade – em comunidades populares, com jovens provavelmente estigmatizados por sua classe social e cor de pele, e que alguns destes jovens talvez já tenham entrado em conflito com a lei. Os repertórios automáticos que nós, estudantes de graduação em Psicologia da Universidade Federal do Rio Grande do Sul possuímos e aplicamos para as situações talvez não sejam apropriados neste meio ambiente. Para trabalhar em tal local e com estes jovens, é necessária uma atitude diferenciada e cuidadosa, tanto intrapessoal e teórica quanto interpessoal e prática.

Primeiramente, há que se considerar que são jovens. Mas o que isto significa? Pensando de forma objetiva, pode-se dizer que são jovens por que tem idades entre 10 e 16 anos, que isso significa que não são “senhores de si” perante a lei e que provavelmente são dependentes de alguém. Estas informações são úteis, e nos permitem observar a postura dominante em relação à juventude, de classificá-la segundo sua negatividade, o que ainda não chegou a ser: adulto, senhor de si, independente (Dayrell, 2003). Entretanto, elaborar um plano de intervenção social utilizando apenas estes dados como base teórica pode ser contraproducente, pois ao partir de dados que são comuns a maioria dos jovens brasileiros, deixa-se de lado as diferenças. Um garoto de 11 anos que mora em um bairro de baixa renda tem muito em comum com outro garoto da mesma idade que mora em um condomínio privado de classe média alta. Entretanto, as diferenças que existem entre os são provavelmente a parte mais importante de uma pesquisa em psicologia social. Relevá-las seria ignorar todo o contexto onde este menino foi criado, seu ambiente, sua cultura, seu espaço físico e seu tempo. Fazendo isto, corre-se o risco da intervenção ser mal-planejada, e de não conseguir apreender os modos pelos quais os jovens constroem suas experiências, fazendo com que todo o trabalho seja inutilizado.

Devido a limitação informativa dos dados quantitativos, os pesquisadores da área do desenvolvimento que lidam com intervenção social tem buscado metodologias mais qualitativas de pesquisa, que permitem a apreensão dos modos pelos quais as pessoas, no caso jovens, constroem suas experiências (Dayrell, 2003). Cada vez mais, a inserção ecológica (Cecconello & Koller, 2003) tem sido utilizada por pesquisadores que buscam uma maior inserção e compreensão dos contextos que estudam. O modelo bioecológico de Bronfenbrenner, que sustenta teoricamente a inserção ecológica, propõe que o desenvolvimento humano seja estudado através da interação de quatro núcleos inter-relacionados: o processo, a pessoa, o contexto e o tempo. Neste modelo, o processo é destacado como o principal mecanismo responsável pelo desenvolvimento, que é visto através de processos de interação recíproca progressivamente mais complexa de um ser humano ativo, biopsicologicamente em evolução, com as pessoas, objetos e símbolos presentes no seu ambiente imediato (Bronfenbrenner & Ceci, 1994; citado por Cecconello & Koller, 2003), sendo um modelo eficiente para realização de pesquisas contextuais, pois permite a integração das muitas variáveis inter-relacionadas no desenvolvimento humano. A inserção ecológica, como método de pesquisa, consiste na inserção no ambiente ecológico a ser estudado, com o objetivo de conhecer sua realidade e investigar as variáveis que ali atuam. Visitas freqüentes, observações, conversas informais e entrevistas são todos métodos válidos de coleta de dados. O ponto forte desta metodologia é sua alta validade ecológica, decorrente desta análise rigorosa dos dados.

Também deve-se levar em consideração que não existe apenas uma juventude monolítica, mas muitas juventudes, diversas entre si (Dayrell, 2003). Em contextos de pobreza material, também é possível que o pesquisador, de sua posição de sujeito suposto saber, considere que os jovens com quem irá trabalhar sejam “pobres coitados” dignos de pena, ou que são incapazes de uma independência maior (e seria irônico se tal erro fosse cometido por alguém interessado em promover o protagonismo juvenil), criminosos sem esperança de recuperação, ou, utilizando-se de uma visão demasiada otimista, esqueça que o contexto em que ele intervém envolve os participantes de seu projeto em crimes, e que talvez alguns deles tenham entrado em contato com a lei.

O último fator teórico que deve ser abordado é o conceito de protagonismo. Ao nos voltarmos para a etmologia deste termo, verificamos que protagnistés era o nome dado ao ator principal do teatro grego, ou aquele que ocupava o lugar principal em um acontecimento (Ferreti; Zibas; Tartuce, 2004). Com base nestas informações, podemos supor que uma intervenção que objetiva incentivar o protagonismo juvenil busca, em última análise, incentivar que os jovens apropriem-se e que sejam os personagens principais de seu próprio desenvolvimento. Este processo aconteceria nos diversos microssistemas em que o jovem vive, seja na família, na escola ou qualquer outro grupo social. Correndo o risco de dizer o óbvio, se há programas que visam estimular os jovens a serem assertivos, a tomarem em suas próprias mãos o seu crescimento, é razoável supor que eles não fazem isto naturalmente, pelo menos nas condições de vida próprias de seu contexto. Acredito que, se quem estiver fazendo esta intervenção não for sensível para as demandas das crianças e dos adolescentes envolvidos, o que acontecerá será a criação de uma nova relação de dependência do jovem, só que ao invés de ser dependente dos pais, dos professores ou do grupo de amigos, será dependente do programa ou do interventor.

Por fim, tal e qual um bom psicoterapeuta, o interventor deve sempre partir do pressuposto que o jovem tem um potencial para o crescimento saudável, mas não deve esquecer-se que a possibilidade de patologia e violência são reais (Maslow, 1968). Sem esta visão realista e crítica, todo o trabalho pode ser em vão.


Referências:
Cecconello, A. M. & Koller, S. H. (2003). Inserção ecológica na comunidade: uma proposta metodológica para o estudo de famílias em situação de risco. Psicologia: Reflexão e Crítica, 16(3), 515-524.

Dayrell, J. (2003). O Jovem como Sujeito Social. Revista Brasileira de Educação, No 24, 40-52.

Ferreti, C.J.; Zibas, D.M.L; Tartuce, G.L.B.P. (2004). Protagonismo Juvenil na Literatura Especializada e na Reforma do Ensino Médio. Cadernos de Pesquisa, v. 34, n. 122, p. 411-423

Maslow, A.H. (1968) Introdução à Psicologia do Ser (2ª Edição). Rio de Janeiro: Eldorado.

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