terça-feira, 21 de abril de 2009

Dignidade humana?

De um certo ponto de vista, a Psicoterapia é uma profissão um tanto quanto engraçada. Não por que a existência humana seja uma comédia sem sentido como querem os nihilistas ou o sofrimento e angústia de nossos pacientes seja ridícula, mas por que os motivos que trazem as pessoas aos consultórios de psicólogos, psiquiatras e psicanalistas, que os fazem sofrer, geralmente são tão insignificantes que é possível rir deles, se podemos nos colocar a uma certa distância.

Eu vejo isso com meus pacientes adolescentes, entre 15 e 17 anos. Não sou tão mais velho do que eles - poderia até dizer que acabei de me formar na escola da adolescência - e as memórias do que me causava angústia três ou quatro anos atrás ainda estão vivas o suficientes para serem fortes, mas longínquas o bastante para serem vistas por outro ponto de vista, mais maduro (espero eu). É bem comum esses pacientes, especialmente durante uma entrevista inicial, ao falarem das brigas em que se meteram em casa, na rua ou em alguma festa, dizerem "eu não me importo com o que os outros pensam: a vida é minha e eu faço o que quero" como se fossem absolutos senhores de si. E, então, quando eu pergunto por que então eles brigaram, me respondem que a mãe o chamou de idiota, o cara na parada questionou a dignidade de sua irmã e sua mãe ou que aquele outro passou a mão na guria dele. Para quem "faz o que quer" e "não se importa com o que os outros pensam" é uma atitude um tanto quanto preocupada com a opinião alheia.

Psicoterapia também é um trabalho delicado. Pode ser óbvio para mim que se eles se importassem menos com o que os outros acham eles estariam sofrendo muito menos, mas para eles, o sofrimento é sinônimo de ter fama de bicha, frouxo ou qualquer coisa assim. Sei disso por que até não muito tempo atrás também eram estas as coisas que mais me assustavam. Também pode ser óbvio para mim que é muito engraçado alguém dar como justificativa para quebrar o nariz de alguém "eu tô pouco me lixando para o que os outros pensam. Além do mais, ele tava olhando torto pra mim", mas para eles, é perfeitamente normal e absolutamente sério. De que adiantaria simplesmente dizer essas coisas para quem não está preparado para ouví-las? Dizer as coisas mastigadas todo mundo faz, e não adianta nada, como aqueles programas para elevar a auto-estima das crianças bem comprovam. Estes adolescentes precisam passar por todo um processo de expansão da consciência, e perceberem por si próprios, como num estalo, o ridículo da situação. É esta expansão da consciência que todo modelo de psicoterapia busca causar em seus pacientes. Claro, muda-se o enfoque de acordo com o psicoterapeuta e sua linha teórica, mas o resultado acaba sendo muito parecido. O método socrático, usado principalmente nas terapias cognitivo-comportamentais, busca, através de perguntas, fazer com que a outra pessoa pense de formas não-convencionais sobre um assunto normal para ela, e o veja de outro ângulo, mais distante, menos sofrido e mais engraçado. Se este objetivo for atingido, pronto! Posso considerar meu trabalho como feito, por que, pode ser que meu paciente sofra novamente no futuro por causa da mesma coisa, mas será então capaz de perceber que aquilo ali é bastante engraçado se se prestar atenção, e parará de sofrer ali mesmo.

Não sei se esta é uma generalização correta, mas creio que todos os sofrimentos psicológicos decorrem disto que poderia se chamar de uma "ultradignificação de si próprio": nos cremos tão importantes para o universo que nos achamos superiores ao ridículo e ao sofrimento. Mas passamos vergonha e sofremos, e sofremos ainda mais por que achamos que não deveria ser assim. Somos, como dizem os nihilistas pós-modernos, insignificantes como poeira para o universo, ou animais com estratégias de sobrevivência que permitem construir foguetes como diria um biólogo, e poderíamos facilmente nos sentirmos mal por causa dessas afirmações. Mas e daí que somos? É indigno sermos o que somos? Nenhum outro animal se preocupa com isso. As lesmas são lesmas, mas nem por isso elas sofrem de depressão! Viver com um pouco menos "dignidade" e um pouco mais de humor certamente nos faria muito bem.

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